Confira a nossa seleção de poemas sobre palavras em português!
As palavras são a substância da poesia, a matéria-prima através da qual se faz esta última.
Combinar palavras de forma interessante, pois, é o métier de todos os poetas que, diferentemente de prosadores, não podem limitar-se a organizá-las conforme o sentido, visto que a poesia exige algo mais.
Assim, os poetas concentram-se de praxe em extrair sentimentos, ideias, emoções e musicalidade das palavras, e por isso criam com elas uma intimidade incomum.
Naturalmente, tal intimidade já foi por vezes explorada e expressa em forma de verso.
Dito isso, preparamos uma seleção com 8 poemas sobre palavras para que você possa apreciar algumas abordagens para este tema.
Boa leitura!
Poemas sobre palavras
Severo narro. Quanto sinto, penso, de Ricardo Reis (Fernando Pesosa)
Severo narro. Quanto sinto, penso.
Palavras são ideias.
Múrmuro, o rio passa, e o que não passa,
Que é nosso, não do rio.
Assim quisesse o verso: meu e alheio
E por mim mesmo lido.
A palavra, de António Ramos Rosa
Eleva-se entre a espuma, verde e cristalina
e a alegria aviva-se em redonda ressonância.
O seu olhar é um sonho porque é um sopro indivisível
que reconhece e inventa a pluralidade delicada.
Ao longe e ao perto o horizonte treme entre os seus cílios.Ela encanta-se. Adere, coincide com o ser mesmo
da coisa nomeada. O rosto da terra se renova.
Ela aflui em círculos desagregando, construindo.
Um ouvido desperta no ouvido, uma língua na língua.
Sobre si enrola o anel nupcial do universo.O gérmen amadurece no seu corpo nascente.
Nas palavras que diz pulsa o desejo do mundo.
Move-se aqui e agora entre contornos vivos.
Ignora, esquece, sabe, vive ao nível do universo.
Na sua simplicidade terrestre há um ardor soberano.
A palavra, de Carlos Drummond de Andrade
Já não quero dicionários
consultados em vão.
Quero só a palavra
que nunca estará neles
nem se pode inventar.Que resumiria o mundo
e o substituiria.
Mais sol do que o sol,
dentro da qual vivêssemos
todos em comunhão,
mudos,
saboreando-a.
Sobre a palavra, de Eugénio de Andrade
Entre a folha branca e o gume do olhar
a boca envelheceSobre a palavra
a noite aproxima-se da chamaAssim se morre dizias tu
Assim se morre dizia o vento acariciando-te a cinturaNa porosa fronteira do silêncio
a mão ilumina a terra inacabadaInterminavelmente
Certas palavras, de Carlos Drummond de Andrade
Certas palavras não podem ser ditas
em qualquer lugar e hora qualquer.
Estritamente reservadas
para companheiros de confiança,
devem ser sacralmente pronunciadas
em tom muito especial
lá onde a polícia dos adultos
não adivinha nem alcança.Entretanto são palavras simples:
definem
partes do corpo, movimentos, actos
do viver que só os grandes se permitem
e a nós é defendido por sentença
dos séculos.E tudo é proibido. Então, falamos.
Exactidão, de Jorge de Sena
Levam as frases sentido
que uma cadência lhes dá:
sentido do não-vivido
a que fica reduzido
o que, escolhido, não há.Do imo do poder ser,
onde o não-sido se arrasta,
ouvi cadências crescer:
vaga música de ter,
na vida, quanto não basta –quanto um sentido se entenda,
que nem verdade ou mentira.
(Que o que dele se aprenda
é como cobarde venda
para que a luz nos não fira.Luz sem luz, brilho da treva
que tudo no fundo é;
e a certeza que se eleva
do fundo da própria treva,
de exacta que seja, é.)Levam justiça consigo
as palavras que dissermos.
Por quanto sentido antigo,
nelas ficou por castigo
o futuro que tivermos.Levam as frases sentido
que uma cadência lhes dá.
É justo, injusto – o escolhido?
Como quereis que, vivido,
ele não seja o que será?
O martírio do artista, de Augusto dos Anjos
Arte ingrata! E conquanto, em desalento,
A órbita elipsoidal dos olhos lhe arda,
Busca exteriorizar o pensamento
Que em suas fronetais células guarda!Tarda-lhe a Ideia! A inspiração lhe tarda!
E ei-lo a tremer, rasga o papel, violento,
Como o soldado que rasgou a farda
No desespero do último momento!Tenta chorar e os olhos sente enxutos!…
É como o paralítico que, à míngua
Da própria voz e na que ardente o lavraFebre de em vão falar, com os dedos brutos
Para falar, puxa e repuxa a língua,
E não lhe vem à boca uma palavra!
A um crucifixo, de Antero de Quental
Há mil anos, bom Cristo, ergueste os magros braços
E clamaste da cruz: há Deus! e olhaste, ó crente,
O horizonte futuro e viste, em tua mente,
Um alvor ideal banhar esses espaços!Porque morreu sem eco o eco de teus passos,
E de tua palavra (ó Verbo!) o som fremente?
Morreste… ah! dorme em paz! não volvas, que descrente
Arrojaras de novo à campa os membros lassos…Agora, como então, na mesma terra erma,
A mesma humanidade é sempre a mesma enferma,
Sob o mesmo ermo céu, frio como um sudário…E agora, como então, viras o mundo exangue,
E ouviras perguntar — de que serviu o sangue
Com que regaste, ó Cristo, as urzes do Calvário? —
Conclusão
Ficamos por aqui!
Esperamos que tenha gostado de nossa seleção de poemas sobre palavras.
Se você curtiu esse conteúdo, não deixe de ver a nossa coletânea de poemas sobre casa.
Um abraço e até a próxima!