Conheça alguns poemas de Basílio da Gama, o poeta mineiro mais conhecido pelo épico O Uraguai!
Basílio da Gama é poeta de importância histórica enorme na literatura brasileira.
Seu poema O Uraguai foi a primeira tentativa sistemática de pintar o modelo épico europeu com cores verde-amarelas, inserindo o índio como personagem ficcional.
Esteticamente, foi a obra também um marco na literatura brasileira, posto o poema abrisse mão, de uma só vez, da rima e da estrofação (algo inesperado para a época em que foi publicado).
Desta forma, Basílio da Gama abriu um caminho que, anos mais tarde, seria percorrido por outros poetas brasileiros e daria um rosto autêntico para a literatura brasileira.
Mas não pense que este poeta mineiro resume-se a O Uraguai. E para mostrá-lo, preparamos uma seleção com 6 poemas de Basílio da Gama.
Aproveite!
Poemas de Basílio da Gama
A uma senhora
Natural do Rio de Janeiro, onde se achava então o Autor
Já, Marfisa cruel, me não maltrata
Saber que usas comigo de cautelas,
Qu’inda te espero ver, por causa d’elas,
Arrependida de ter sido ingrata.Com o tempo, que tudo desbarata,
Teus olhos deixarão de ser estrelas;
Verás murchar no rosto as faces belas,
E as tranças d’oiro converter-se em prata.Pois se sabes que a tua formosura
Por força há de sofrer da idade os danos,
Por que me negas hoje esta ventura?Guarda para seu tempo os desenganos,
Gozemo-nos agora, enquanto dura,
Já que dura tão pouco a flor dos anos.
Morte de Lindóia
Um frio susto corre pelas veias
De Caitutu que deixa os seus no campo;
E a irmã por entre as sombras do arvoredo
Busca com a vista, e treme de encontrá-la.
Entram enfim na mais remota, e interna
Parte de antigo bosque, escuro e negro,
Onde, ao pé duma lapa cavernosa,
Cobre uma rouca fonte, que murmura,
Curva latada e jasmins e rosas.
Este lugar delicioso e triste,
Cansada de viver, tinha escolhido
Para morrer a mísera Lindóia.
Lá reclinada, como que dormia,
Na branda relva e nas mimosas flores,
Tinha a face na mão e a mão no tronco
Dum fúnebre cipreste, que espalhava
Melancólica sombra. Mais de perto
Descobrem que se enrola no seu corpo
Verde serpente, e lhe passeia e cinge
Pescoço e braços, e lhe lambe o seio.
Fogem de a ver assim sobressaltados
E param cheios de temor ao longe;
E nem se atrevem a chamá-la e temem
Que desperte assustada e irrite o monstro,
E fuja, e apresse no fugir a morte.
Porém o destro Caitutu, que treme
Do perigo da irmã, sem mais demora
Dobrou as pontas do arco, e quis três vezes
Soltar o tiro, e vacilou três vezes
Entre a ira e o temor. Enfim sacode
O arco e faz voar a aguda seta,
Que toca o peito de Lindóia e fere
A serpente na testa, e a boca e os dentes
Deixou cravados no vizinho tronco.
Açoita o campo com a ligeira cauda
O irado monstro, e em tortuosos giros
Se enrosca no cipreste, e verte envolto
Em negro sangue o lívido veneno.
Leva nos braços a infeliz Lindóia
O desgraçado irmão, que ao despertá-la
Conhece, com que dor! no frio rosto
Os sinais do veneno, e vê ferido
Pelo dente sutil o brando peito.
Os olhos, em que Amor reinava, um dia,
Cheios de morte; e muda aquela língua,
Que ao surdo vento e aos ecos tantas vezes
Contou a larga história de seus males.
Nos olhos Caitutu não sofre o pranto,
E rompe em profundíssimos suspiros,
Lendo na testa da fronteira gruta
De sua mão já trêmula gravado
O alheio crime, e a voluntária morte.
E por todas as partes repetido
O suspirado nome de Cacambo.
Inda conserva o pálido semblante
Um não sei quê de magoado, e triste,
Que os corações mais duros enternece.
Tanto era bela no seu rosto a morte!
A resignação
Por ocasião do ser o autor condenado pelo
Tribunal da Inconfidência ao degredo de África.Temam embora a morte os que aferrados
Aos grossos cabedais, que possuíam,
Nunca tão de repente presumiam
Que lhes fossem das mãos arrebatados.Sintam deixar co’a vida os começados
Muros d’altos palácios, que erigiam;
A cara esposa, os filhos, que cresciam;
Os brandos leitos; os tremós dourados.Que eu sem bens e sem casa, vagabundo,
Mal coberto c’o manto da indigência,
Já não temo da morte o horror profundo.No que me tira não me faz violência,
Que o melhor modo de sair do mundo
É cheio ou de miséria ou de inocência.
Ao marquês de Pombal
Apresentando-lhe em 1769 o poema Uraguai
Ergue de jaspe um globo alvo e rotundo,
E em cima a estátua de um herói perfeito;
Mas não lhe lavres nome em campo estreito,
Que o seu nome enche a terra, e o mar profundo.Mostra no jaspe, artífice facundo,
Em muda história tanto ilustre feito,
Paz, justiça, abundância e firme peito,
Isto nos basta a nós, e ao nosso mundo.Mas porque pode em século futuro,
Peregrino, que o mar de nós afasta,
Duvidar quem anima o jaspe duro;Mostra-lhe mais Lisboa rica e vasta,
E o comércio, e em lugar remoto e escuro,
Chorando a hipocrisia. Isto lhe basta.
À nau Serpente
Por ocasião de cair ao mar no Rio de Janeiro
em 8 de fevereiro de 1767Já do lenho as prisões se desataram
E assustada serpente as águas trilha,
Já ondeia no mar a instável ilha,
E já no fundo as âncoras pegaram.Os ventos sobre as asas se firmaram
Por ver de perto a nova maravilha,
E ao vasto peso da disforme quilha,
Gemeu Netuno, e as ondas s’encurvaram.Verdes Ninfas azuis do pego undoso,
Conduzi pelos úmidos lugares
Esse errante edifício majestoso:E entre tantas empresas singulares,
Veja o mundo qual é mais glorioso,
Dar leis à terra, se pôr freio aos mares.
Ao marquês de Pombal
Não temas, não, marquês, que o povo injusto
De teus grandes serviços esquecido,
Pelos gritos da inveja enfurecido
Solicite abolir teu nobre busto.Para ser imortal teu nome augusto
Não depende do bronze derretido;
Em mais firmes padrões fica insculpido
Teu nome excelso, teu valor robusto.Lisboa restaurada, o Reino ornado
De ciência, de indústria e de cultura,
De política e comércio apropriado:A tropa regulada, a fé segura,
O tesouro provido, o mar guardado:
Eis aqui do teu gênio a cópia pura.
Conclusão
Então é isso!
Esperamos que você tenha gostado de nossa seleção de poemas de Basílio da Gama.
Se você curtiu esse conteúdo, não deixe de ver a nossa coletânea de Adelino Fontoura.
Um abraço e até a próxima!