Confira a nossa seleção de poemas sobre inspiração em português!
A inspiração tem sido tão abordada ao longo dos anos que, hoje, há quem a enxergue como quase sobrenatural.
Por um lado, temos de admitir que há algo de contraproducente nesta idealização que quer vê-la como um toque divino, ou algo que não ocorre senão com escolhidos — talvez estes que assim a enxergam procuram justificar o seu desleixo.
De outro lado, porém, temos de nos render a essa força, que às vezes nos submete como um raio apresentando-nos ideias que nos parecem excelentes, respostas que julgávamos não conseguir.
E assim, deste efeito surpreendente, surge uma admiração natural e um interesse por sua natureza.
Dito isso, preparamos uma seleção com 5 poemas sobre inspiração para que você possa apreciar algumas abordagens em verso para esta interessante temática.
Boa leitura!
Poemas sobre inspiração
Última folha, de Machado de Assis
Musa, desce do alto da montanha
Onde aspiraste o aroma da poesia,
E deixa ao eco dos sagrados ermos
A última harmonia.Dos teus cabelos de ouro, que beijavam
Na amena tarde as virações perdidas,
Deixa cair ao chão as alvas rosas
E as alvas margaridas.Vês? Não é noite, não, este ar sombrio
Que nos esconde o céu. Inda no poente
Não quebra os raios pálidos e frios
O sol resplandecente.Vês? Lá ao fundo o vale árido e seco
Abre-se, como um leito mortuário;
Espera-te o silêncio da planície,
Como um frio sudário.Desce. Virá um dia em que mais bela,
Mais alegre, mais cheia de harmonias,
Voltes a procurar a voz cadente
Dos teus primeiros dias.Então coroarás a ingênua fronte
Das flores da manhã, — e ao monte agreste,
Como a noiva fantástica dos ermos,
Irás, musa celeste!Então, nas horas solenes
Em que o místico himeneu
Une em abraço divino
Verde a terra, azul o céu;Quando, já finda a tormenta
Que a natureza enlutou,
Bafeja a brisa suave
Cedros que o vento abalou;E o rio, a árvore e o campo,
A areia, a face do mar,
Parecem, como um concerto,
Palpitar, sorrir, orar;Então sim, alma de poeta,
Nos teus sonhos cantarás
A glória da natureza,
A ventura, o amor e a paz!Ah! mas então será mais alto ainda;
Lá onde a alma do vate
Possa escutar os anjos,E onde não chegue o vão rumor dos homens;
Lá onde, abrindo as asas ambiciosas,
Possa adejar no espaço luminoso,
Viver de luz mais viva e de ar mais puro,
Fartar-se do infinito!Musa, desce do alto da montanha
Onde aspiraste o aroma da poesia,
E deixa ao eco dos sagrados ermos
A última harmonia!
Os antigos invocavam as Musas, de Álvaro de Campos (Fernando Pessoa)
Os antigos invocavam as Musas.
Nós invocamo-nos a nós mesmos.
Não sei se as Musas apareciam —
Seria sem dúvida conforme o invocado e a invocação —Mas sei que nós não aparecemos.
Quantas vezes me tenho debruçado
Sobre o poço que me suponho
E balido “Ah!” pra ouvir um eco,
E não tenho ouvido mais que o visto —
O vago alvor escuro com que a água resplandece
Lá na inutilidade do fundo.
Nenhum eco para mim…
Só vagamente uma cara, que deve ser a minha porque não pode ser de outro,É uma coisa quase invisível,
Exceto como luminosamente vejo
Lá no fundo…
No silêncio e na luz falsa do fundo…Que Musa!…
A avenida das lágrimas, de Olavo Bilac
A um Poeta morto
Quando a primeira vez a harmonia secreta
De uma lira acordou, gemendo, a terra inteira,
– Dentro do coração do primeiro poeta
Desabrochou a flor da lágrima primeira.E o poeta sentiu os olhos rasos de água;
Subiu-lhe à boca, ansioso, o primeiro queixume:
Tinha nascido a flor da Paixão e da Mágoa,
Que possui, como a rosa, espinhos e perfume.E na terra, por onde o sonhador passava,
Ia a roxa corola espalhando as sementes:
De modo que, a brilhar, pelo solo ficava
Uma vegetação de lágrimas ardentes.Foi assim que se fez a Via Dolorosa,
A avenida ensombrada e triste da Saudade,
Onde se arrasta, à noite, a procissão chorosa
Dos órfãos do carinho e da felicidade.Recalcando no peito os gritos e os soluços,
Tu conheceste bem essa longa avenida,
– Tu que, chorando em vão, te esfalfaste, de bruços,
Para, infeliz, galgar o Calvário da Vida.Teu pé também deixou um sinal neste solo;
Também por este solo arrastaste o teu manto…
E, ó Musa, a harpa infeliz que sustinhas ao colo,
Passou para outras mãos, molhou-se de outro pranto.Mas tua alma ficou, livre da desventura,
Docemente sonhando, às delícias da lua:
Entre as flores, agora, uma outra flor fulgura,
Guardando na corola uma lembrança tua…O aroma dessa flor, que o teu martírio encerra,
Se imortalizará, pelas almas disperso:
– Porque purificou a torpeza da terra
Quem deixou sobre a terra uma lágrima e um verso.
Altares, de Augusto dos Anjos
“Estes sinceros cânticos dispersos
À Musa Inspiradora dos meus versos”Quero que o povo ante esta deusa austera
Ajoelhado lhe oscule o pó do rastro!
E a espere ansioso, como quem espera
A passagem magnífica de um astro!Fugida das paragens luminosas
Ainda a engrinalda, acesa, a última réstia…
Calçam-lhe os pés dois cálices de rosas
E o sol com o manto do seu oiro veste-a!Alvo colar de pérolas pequenas
Guarda no estojo de coral da boca,
Seu passo é leve como o das camenas
E a estrada em que anda de magnólias touca.Envergonhado o rouxinol se cala
Lhe ouvindo a voz: — que a sua voz de santa
Povoa a terra de aves, quando fala,
Povoa o céu de estrelas, quando canta!Os olhos são-lhe quietos lagos onde
Seu luminoso espírito se espelha
E o coração, que a hóstia do amor esconde,
Aurilavrado artóforo semelha!A asa que ao sol, cortando águas serenas,
Como um leque de prata, um cisne espalma,
Tem nódoas e tem máculas nas penas,
Comparada à brancura de su’alma!Anima-a celestial, vivido sopro…
Rondam-lhe beijos rútilos os flancos!
Ah!… Certo foi um deus com um sacro escopro,
Quem lhe esculpiu os belos braços brancos!Quando ela surge em meio de secretas
Harmonias e brilhos singulares,
— Cantam todos os pássaros e poetas
E iluminam-se todos os altares!
Musa dos olhos verdes, de Machado de Assis
Musa dos olhos verdes, musa alada,
Ó divina esperança,
Consolo do ancião no extremo alento,
E sonho da criança;Tu que junto do berço o infante cinges
Co’os fúlgidos cabelos;
Tu que transformas em dourados sonhos
Sombrios pesadelos;Tu que fazes pulsar o seio às virgens;
Tu que às mães carinhosas
Enches o brando, tépido regaço
Com delicadas rosas;Casta filha do céu, virgem formosa
Do eterno devaneio,
Sê minha amante, os beijos meus recebe,
Acolhe-me em teu seio!Já cansada de encher lânguidas flores
Com as lágrimas frias,
A noite vê surgir do oriente a aurora
Dourando as serranias.Asas batendo à luz que as trevas rompe,
Piam noturnas aves,
E a floresta interrompe alegremente
Os seus silêncios graves.Dentro de mim, a noite escura e fria
Melancólica chora;
Rompe estas sombras que o meu ser povoam;
Musa, sê tu a aurora!
Conclusão
Ficamos por aqui!
Esperamos que tenha gostado de nossa seleção de poemas sobre inspiração.
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Um abraço e até a próxima!