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3 poemas de Alexandre Herculano, grande poeta e escritor português

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Confira a nossa seleção de poemas de Alexandre Herculano, esse grande poeta e escritor português que é um dos principais representantes do romantismo em Portugal!

Alexandre Herculano, escritor, poeta, jornalista e historiador português, é sem dúvida um dos autores mais proeminentes da língua portuguesa.

Assim como seu compatriota Almeida Garrett, Herculano não se limitou a atuar somente no campo da arte, como envolveu-se na luta política tomando partido da corrente liberal que se espalhava por Portugal, sendo perseguido pelo governo e obrigado a emigrar, em 1831, para a França.

É vasta a obra de Alexandre Herculano e inclui gêneros diversos. Para além da poesia, Herculano é consagrado na literatura portuguesa por ter introduzido no país o gênero de romance histórico, através de suas célebres Lendas e narrativas.

Sabendo disso, cabe verificar se o prestígio deste artista justifica-se pelo engenho artístico.

Para comprová-lo, preparamos uma seleção de 3 poemas de Alexandre Herculano para você.

Boa leitura!

Poemas de Alexandre Herculano

A Graça

Que harmonia suave
É esta, que na mente
Eu sinto murmurar,
Ora profunda e grave,
Ora meiga e cadente,
Ora que faz chorar?
Porque da morte a sombra,
Que para mim em tudo
Negra se reproduz,
Se aclara, e desassombra
Seu gesto carrancudo,
Banhada em branda luz?
Porque no coração
Não sinto pesar tanto
O férreo pé da dor,
E o hino da oração,
Em vez de irado canto,
Me pede íntimo ardor?

És tu, meu anjo, cuja voz divina
Vem consolar a solidão do enfermo,
E a contemplar com placidez o ensina
De curta vida o derradeiro termo?

Oh, sim!, és tu, que na infantil idade,.
Da aurora à frouxa luz,
Me dizias: «Acorda, inocentinho,
Faz o sinal da Cruz.»
És tu, que eu via em sonhos, nesses anos
De inda puro sonhar,
Em nuvem d’ouro e púrpura descendo
Coas roupas a alvejar.
És tu, és tu!, que ao pôr do Sol, na veiga,
Junto ao bosque fremente,
Me contavas mistérios, harmonias
Dos Céus, do mar dormente.
És tu, és tu!, que, lá, nesta alma absorta
Modulavas o canto,
Que de noite, ao luar, sozinho erguia
Ao Deus três vezes santo.
És tu, que eu esqueci na idade ardente
Das paixões juvenis,
E que voltas a mim, sincero amigo,
Quando sou infeliz.
Sinta a tua voz de novo,
Que me revoca a Deus:
Inspira-me a esperança,
Que te seguiu dos Céus!…

A voz

É tão suave ess’hora,
Em que nos foge o dia,
E em que suscita a Lua
Das ondas a ardentia,

Se em alcantis marinhos,
Nas rochas assentado,
O trovador medita
Em sonhos enleado!

O mar azul se encrespa
Coa vespertina brisa,
E no casal da serra
A luz já se divisa.

E tudo em roda cala
Na praia sinuosa,
Salvo o som do remanso
Quebrando em furna algosa.

Ali folga o poeta
Nos desvarios seus,
E nessa paz que o cerca
Bendiz a mão de Deus.

Mas despregou seu grito
A alcíone gemente,
E nuvem pequenina
Ergueu-se no ocidente:

E sobe, e cresce, e imensa
Nos céus negra flutua,
E o vento das procelas
Já varre a fraga nua.

Turba-se o vasto oceano,
Com hórrido clamor;
Dos vagalhões nas ribas
Expira o vão furor,

E do poeta a fronte
Cobriu véu de tristeza;
Calou, à luz do raio,
Seu hino à natureza.

Pela alma lhe vagava
Um negro pensamento,
Da alcíone ao gemido,
Ao sibilar do vento.

Era blasfema ideia,
Que triunfava enfim;
Mas voz soou ignota,
Que lhe dizia assim:

«Cantor, esse queixume
Da núncia das procelas,
E as nuvens, que te roubam
Miríades de estrelas,

E o frêmito dos euros,
E o estourar da vaga,
Na praia, que revolve,
Na rocha, onde se esmaga,

Onde espalhava a brisa
Sussurro harmonioso,
Enquanto do éter puro
Descia o Sol radioso,

Tipo da vida do homem,
É do universo a vida:
Depois do afã repouso,
Depois da paz a lida.

Se ergueste a Deus um hino
Em dias de amargura;
Se te amostraste grato
Nos dias de ventura,

Seu nome não maldigas
Quando se turba o mar:
No Deus, que é pai, confia,
Do raio ao cintilar.

Ele o mandou: a causa
Disso o universo ignora,
E mudo está. O nume,
Como o universo, adora!»

Oh, sim, torva blasfêmia
Não manchará seu canto!
Brama a procela embora;
Pese sobre ele o espanto;

Que de sua harpa os hinos
Derramará contente
Aos pés de Deus, qual óleo
Do nardo recendente.

Num álbum

Quando o Senhor envia
O trovador ao mundo,
Faz devorar a essa alma
Fel amargoso e imundo;

Porque lhe diz: — “Poeta,
Vai conhecer a terra;
Prova dos seus deleites;
Prova do mal que encerra.

Desses e deste esgota
As taças muitas vezes,
Embora de uma e doutra
Aches no fundo fezes:

E quando bem souberes
Que tudo é sonho vão;
Que é nada a dor e o gozo,
Solta o teu hino então.”

E o pobre desterrado
Vem seu mister cumprir.
Nasce: homens e universo,
Tudo lhe vê sorrir;

E o seu balbuciar
Um canto é d’inocência:
Mas outro foi seu fado;
Guia-o a providencia.

É querubim precito
Qu’ inda entrevê o céu,
Mas através da vida,
Mas através de um véu.

Em turbilhão d’afetos,
Seu íntimo viver
Rápido lhe devora
Sperança, amor e crer.

Do gozo nos delí­rios
Debalde busca o amor;
Saudade melancólica
Pede debalde à dor.

Depois, desanimado,
Para a pensar em si,
Acha no seio um ermo,
E tristemente ri.

É desde aquele instante
De um acordar atroz,
Que ao condenado lembra
Do que o mandou a voz.

Então entende e cumpre
Seu barbaro destino;
Então é que elle aprende
A modular um hino.

Virgem, ao que assim passa
Por meio do existir,
Calcando os frios restos
Do crer e do sentir,

Não peças te revele
Sua alma na poesia,
E dê aos pensamentos
O encanto da harmonia;

Porque lá, nesse abismo,
Não resta uma ilusão:
Só ha perpétua noite,
E injuria e maldição.

Não entenderas, virgem
Ainda innocente e pura,
O canto que surgira
Dessa alma gasta e escura.

Deixa-o seguir seu norte,
Cumprir missão cruel;
Deixa-o verter o escárnio;
Deixa-o verter o fel;

Deixa-o cuspir em faces
Onde não ha pudor,
E ao mundo, ébrio de si,
Rindo ensinar a dor.

As santas harmonias
De cântico inocente
Sabe-as o alvor do dia
Quando rompe do oriente;

Murmura-as o regato;
Vibra-as o rouxinol;
Vem no zumbir do insecto,
No prado, ao pôr do sol;

Vivem no puro afeto
Da filial piedade,
Nos sonhos e esperanças
Da juvenil idade.

Esta poesia é tua:
Eu já a ouvi e amei;
Mas hoje nem a entendo,
Nem repeti-la sei.

Assim, meu nome só
Escreverei aqui;
Som vão, inteligível
Apenas para ti;

Extinto candelabro
Do templo do Senhor,
Que por algumas horas
Deu luz, teve calor;

Lenda de sepultura,
Que fala em glória e vida,
E esconde ossada infecta
Dos vermes corroída;

Pinheiro solitário,
Que o raio fulminou,
E que gemeu tombando,
E não mais murmurou.

Conclusão

Ficamos por aqui!

Esperamos que tenha gostado de nossa seleção de poemas de Alexandre Herculano.

Se você curtiu esse conteúdo, não deixe de ver a nossa coletânea de Mário de Sá-Carneiro.

Um abraço e até a próxima!

Como citar este conteúdo COMO FAZER UM POEMA. 3 poemas de Alexandre Herculano, grande poeta e escritor português. [S.I.] 2021. Disponível em: https://comofazerumpoema.com/poemas-de-alexandre-herculano-poeta-portugues/. Acesso em: 25 out. 2024.