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4 poemas de Junqueira Freire, patrono da cadeira nº 25 da ABL

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Confira a nossa seleção de poemas de Junqueira Freire, patrono da cadeira nº 25 da ABL e destacado romântico brasileiro!

Junqueira Freire, assim como Laurindo Rabelo, é poeta enquadrado no que se convencionou chamar de segunda geração romântica brasileira (ou ultrarromantismo).

Os poemas de Junqueira Freire são marcados por notas de pessimismo, melancolia e sentimentalismo, frutos de uma biografia que lhe impingiu um violento conflito existencial.

Ocorre que, por motivos familiares, o poeta ingressou na Ordem dos Beneditinos, aos 19 anos, sem possuir vocação religiosa.

Disso sucedeu uma crise terrível, que forçou-o a pedir a secularização, que o permitiria afastar-se da ordem preservando-lhe os votos perpétuos.

Obtida a autorização, retorna para casa, porém pouco depois morreria, com somente 23 anos.

Todas essas experiências estão fortemente marcadas na obra deste poeta que, como bem resume a Academia Brasileira de Letras, pode ser definida nas seguintes palavras:

O poeta clama na sua cela e traz desordenadamente este tumulto ao leitor.

Pensando nisso, preparamos uma lista com 4 poemas de Junqueira Freire, para que você possa conhecer a obra deste importante poeta brasileiro.

Aproveite!

Poemas de Junqueira Freire

Saudade

Ao meu amigo
Frei Bento da Trindade Cortez
Atualmente no Mosteiro do Rio de Janeiro

“…porque lágrimas também são amor.”

Dr. J. J. B. de Oliveira

Em minhas horas de noturna insônia,
Co’os olhos fitos no porvir longínquo,
Eu penso em mim, — e na segunda ideia
Encontro-me contigo.

Eu te pranteio no arrebol da aurora,
Que em teu exílio meditando esperas.
Envolto num crepúsculo te enxergo
A deplorar teus fados.

Nas nuvens tintas de sanguíneas listras
Lagrimas verto que sobre elas mando.
Partem, — porém do caminhar cansadas
Descaem no oceano.

Desesperado então, maldigo o espaço,
Maldigo o céu e a terra, o vácuo e o pleno.
Em cada criação deparo um erro.
Nem acho Deus tão sábio.

E na minh’alma se desenha ao vivo
Melhor, mais belo, mais ditoso um mundo.
Tiro do nada, sem ausência e males,
Um orbe todo novo.

O amor da pátria que os tiranos banem
Não choraria maldições e sangue.
Nem tu nem eu seriamos cortados
Por divisões de abismos.

Mas quando ainda não acabo o sonho,
Diviso armadas que vão mar em fora.
Desperto, e caio nos aéreos braços
Da quimera sublime.

E mais amargo te lamento a sorte,
Tu, mártir feito pelas mãos dos bonzos.
Invoco o céu que entornará sobre eles
Alabastros de anátema.

Ligando a mim teu coração dorido,
Que a teus amigos em penhor deixaste,
Tateio nele as emoções tão vivas,
Que em teu desterro sofres.

Conheço as aflições que te salteiam,
Nobre proscrito. O sol, a lua, os astros
Cruzam teu ponto, e trazem-me sinceros
Tuas ingênuas dores.

Sim! para os claustros não nasceu tua alma.
Teu coração não te palpita — Monge.
Nem tão baixo teus Ímpetos serpeiam,
Que um cárcere os contente.

Nesse vasto palor que te orna a fronte,
— Sinal dos homens de profundo gênio,
Eu leio a grande e destemida ideia,
Que não cabe nos claustros.

Deserta, oh gênio, do covil imundo,
Onde o leão dos vícios se alaparda.
Ah! esta cela, onde a indolência dorme,
Não pode, não, ser tua.

Coral guardado nas flumíneas urnas,
Quem há de te arrancar do equóreo fundo?
Não serias mais belo, em áureo engaste,
No colo de uma virgem?

Canção do católico

Não sentes por sobre a face,
Como um raio inopinado,
Esse anátema sagrado,
Essa férrea excomunhão?
Não sentes a espada nua
De Roma no teu semblante,
De Roma, — eterno gigante,
Sustendo infernos na mão?

Ah! triste, perjuro infame,
Que esqueces esse legado,
Santa herança do passado,
Santa crença de Jesus!
Que a negras voragens desces,
E julgas que ao céu te elevas!
Que por turbilhões de trevas
Trocas um reino de luz!

Ah! triste, que te abismaste
Num precipício insondável
Com esse orgulho execrável
Que Lusbel inspira aos seus!
Que duas vezes perdeste
Esse domínio sagrado,
Paraíso resgatado
Co’o sangue puro de Deus!

Ah! triste, que espedaçaste,
Com sacrilégio altanado,
O juramento prestado
Junto à fonte batismal!
Co’o perjúrio que fizeste,
Tu, infante estremecido,
Cravaste um punhal buído
No coração paternal!

Ah! triste, que te desgarras,
De queda em queda passando,
Como do monte rolando
Costuma a pedrinha vir.
Ah! onde, cristão perjuro,
Parará teu baque infindo?
Ou irás sempre caindo
De um em outro nadir?

Ah! triste, que insano clamas,
Com teus sofismas cruentos,
Que de livres pensamentos
Precisa o espírito teu!
E com Lutero te abraças,
Tu, apóstata ignorante,
Na convicção protestante,
Prelúdio certo do ateu!

Vai, apóstata, perjuro,
Com esse raio gravado,
Esse anátema sagrado,
Essa férrea excomunhão!
Não sentes a espada nua
De Roma no teu semblante,
De Roma, — eterno gigante,
Sustendo infernos na mão?

Louco
(Hora de Delírio)

Não, não é louco. O espírito somente
É que quebrou-lhe um elo da matéria.
Pensa melhor que vós, pensa mais livre,
Aproxima-se mais à essência etérea.

Achou pequeno o cérebro que o tinha:
Suas idéias não cabiam nele;
Seu corpo é que lutou contra sua alma,
E nessa luta foi vencido aquele,

Foi uma repulsão de dois contrários:
Foi um duelo, na verdade, insano:
Foi um choque de agentes poderosos:
Foi o divino a combater com o humano.

Agora está mais livre. Algum atilho
Soltou-se-lhe o nó da inteligência;
Quebrou-se o anel dessa prisão de carne,
Entrou agora em sua própria essência.

Agora é mais espírito que corpo:
Agora é mais um ente lá de cima;
É mais, é mais que um homem vão de barro:
É um anjo de Deus, que Deus anima.

Agora, sim – o espírito mais livre
Pode subir às regiões supernas:
Pode, ao descer, anunciar aos homens
As palavras de Deus, também eternas.

E vós, almas terrenas, que a matéria
Os sufocou ou reduziu a pouco,
Não lhe entendeis, por isso, as frases santas.
E zombando o chamais, portanto: – um louco!

Não, não é louco. O espírito somente
É que quebrou-lhe um elo da matéria.
Pensa melhor que vós, pensa mais livre.
Aproxima-se mais à essência etérea.

Desejo
(Hora de Delírio)

Se além dos mundos esse inferno existe,
Essa pátria de horrores,
Onde habitam os tétricos tormentos,
As inefáveis dores;

Se ali se sente o que jamais na vida
O desespero inspira:
Se o suplício maior, que a mente finge,
A mente ali respira;

Se é de compacta, de infinita brasa,
O solo que se pisa:
Se é fogo, e fumo, e súlfur, e terrores
Tudo que ali se visa;

Se ali se goza um gênero inaudito
De sensações terríveis;
Se ali se encontra esse real de dores
Na vida não possíveis;

Se é verdade esse quadro, imaginam
As seitas dos cristãos;
Se esses demônios, anjos maus, ou fúrias,
Não são uns erros vãos;

Eu – que tenho provado neste mundo
As sensações possíveis;
Que tenho ido da afecção mais terna
Às penas mais incríveis;

Eu – que tenho pisado o colo altivo
De vária e muita dor;
Que tenho sempre das batalhas dela
Surgido vencedor;

Eu – que tenho arrostado imensas mortes,
E que pareço eterno;
Eu quero de uma vez morrer p’ra sempre,
Entrar por fim no inferno!

Eu quero ver se encontro ali no abismo
Um tormento invencível:
– Desses que achá-los na existência toda
Jamais será possível!

Eu quero ver se encontro alguns suplícios,
Que o coração me domem;
Quero lhe ouvir esta palavra incógnita:
– Chora por fim, – que és homem!

Que, de arrostar as dores desta vida,
Quase pareço eterno!
Estou cansado de vencer o mundo,
Quero vencer o inferno!

Conclusão

Então é isso!

Esperamos que tenha gostado de nossa seleção de poemas de Junqueira Freire.

Um abraço e até a próxima!

Como citar este conteúdo COMO FAZER UM POEMA. 4 poemas de Junqueira Freire, patrono da cadeira nº 25 da ABL. [S.I.] 2021. Disponível em: https://comofazerumpoema.com/poemas-de-junqueira-freire-patrono-abl-poesia/. Acesso em: 6 jun. 2024.