Saiba o que é anáclase em poesia, conheça suas características e veja exemplos de sua aplicação!
A anáclase é um recurso estilístico frequentemente encontrado na poesia de diversos idiomas.
Seu efeito é gerar um distúrbio intencional no ritmo do verso, que pode simplesmente dinamizá-lo ou chamar a atenção para determinada palavra.
A seguir, elucidaremos o que é anáclase em poesia, quais são suas características e daremos exemplos de sua aplicação.
Definição de anáclase
Na poesia moderna, anáclase é o nome que se dá à inversão no posicionamento entre uma sílaba forte e uma sílaba fraca em versos de cadência silábico-acentual.
Em português, o mais comum é encontrarmos a anáclase em versos de alternância binária, o que equivale, na prática, a transformar um iambo num troqueu ou vice-versa.
Este recurso estilístico deu-se nas línguas modernas por inspiração em processos semelhantes empregados na poesia greco-latina, em que era comum a inversão da quantidade da última sílaba de um pé com a inicial do pé seguinte.
A anáclase é também grafada anaclasis, termo proveniente do grego anáklasis, que significa “refração da luz ou do som”.
Aplicação da anáclase
A anáclase só se aplica a versos de cadência silábico-acentual, isto é, versos caracterizados tanto pelo número de sílabas poéticas que o compõem, quanto pelo posicionamento de seus acentos.
Em outras palavras: para que a anáclase seja empregada, e portanto surta o efeito desejado, e sendo a anáclase a inversão do posicionamento de duas sílabas, é preciso que haja um posicionamento natural destas sílabas no verso.
Um exemplo de anáclase se dá naquele que talvez seja o verso mais famoso da literatura mundial, presente em Hamlet, de Shakespeare:
To be or not to be, that is the question (– ~ – ~ – ~ ~ – – ~)
No verso acima, percebemos que o demonstrativo “that” está posicionado num local onde o ritmo iâmbico do verso demandaria uma sílaba não acentuada.
Empregando a anáclase, Shakespeare perturba intencionalmente o ritmo natural do verso, o que resulta numa notória ênfase na palavra fora de posição.
Exemplo de anáclase
Daremos mais um exemplo do emprego de anáclase, desta vez na poesia portuguesa.
Abaixo citamos as três primeiras estrofes do poema A volta da Primavera, de Castro Alves:
Ai! não maldigas minha fronte pálida,
E o peito gasto ao referver de amores.
Vegetam louros — na caveira esquálida
E a sepultura se reveste em flores.Bem sei que um dia o vendaval da sorte
Do mar lançou-me na gelada areia.
Serei… que importa? o D. Juan da morte
Dá-me o teu seio — e tu serás Haideia!Pousa esta mão — nos meus cabelos úmidos!…
Ensina à brisa ondulações suaves!
Dá-me um abrigo nos teus seios túmidos!
Fala!… que eu ouço o pipilar das aves!
Todos estes doze decassílabos enquadram-se perfeitamente no ritmo iâmbico, isto é, seguindo um padrão de átona-tônica, átona-tônica, átona-tônica… até a última sílaba tônica do verso (– ~ – ~ – ~ – ~ – ~).
Notamos, contudo, o emprego da anáclase na primeira sílaba de alguns destes versos, que iniciam-se por sílaba tônica em vez de átona, como é natural do ritmo iâmbico.
Tal como no exemplo de Shakespeare, isso resulta num realce das palavras nas quais o acento invertido se encontra.