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Epístola: o que é, características e exemplos

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Saiba o que é epístola em poesia, conheça suas características e veja exemplos de sua aplicação!

A epístola é um tipo de composição poética cultivado desde a Antiguidade e, embora modernamente tenha caído em desuso, permanece viva na obra de muitos poetas.

O interessante da epístola é que, diferente de outros tipos de poemas, nela o poeta dirige-se diretamente a um ou mais destinatários, algo cujo efeito é uma aproximação imediata entre ambos.

A seguir, elucidaremos o que é epístola em poesia, quais são suas características e daremos exemplos de sua aplicação.

Definição de epístola

Epístola é uma composição literária em feitio de carta, escrita em prosa ou em verso, pela qual o autor dirige-se diretamente a um ou mais destinatários.

A epístola pode vir datada, e tem como característica especificar sempre o destinatário, podendo este último consistir em um ou mais entes, reais ou fictícios.

Quando satírica, é comum a epístola vir assinada por um “autor anônimo”, ou por algum pseudônimo.

Ao longo do tempo, a epístola desenvolveu-se em gênero literário, tomando rumos diferentes na prosa e na poesia: nesta, o feitio literário da composição costuma ser mais evidente; naquela, correspondências pessoais são também integradas ao gênero, quando, por qualquer motivo, seu conteúdo se mostra de interesse histórico ou documental.

O termo epístola é derivado do grego epistole (“mensagem”) que passou ao latim como epistola (“carta”, “mensagem”).

História da epístola

A epístola, em seu sentido mais amplo, é um tipo de composição literária antiquíssimo, presente em diferentes tradições.

Fundamentalmente, a epístola é uma mensagem direcionada a um ou mais destinatários e, em prosa, temos epístolas no Antigo Egito e na tradição cristã, cujo exemplo mais conhecido são as famosas epístolas paulinas, integradas ao Novo Testamento.

É na antiguidade clássica, porém, que as epístolas se consolidaram em gênero literário.

Em prosa, o gênero partiu de epístolas como as de Cícero e Sêneca, direcionadas a destinatários reais, até a prática moderna, em que tal nem sempre se verifica.

Gente pobre, obra de estreia Dostoiévski e Os sofrimentos do jovem Werther, de Goethe, são dois exemplos dos chamados romances epistolares, estilo ficcional que bem representa os resultados da evolução do gênero epistolar em prosa.

Em verso, o primeiro exemplo que temos do emprego de epístolas é do poeta Horácio, que foi seguido pouco depois por Ovídio.

Como nota J. A. Cuddon no The Penguin Dictionary of Lit. Terms and Lit. Theory, a obra epistolar destes dois poetas demonstram bem os dois tipos de epístolas mais frequentes: (1) epístolas a respeito de temas morais e filosóficos (Horácio) e (2) epístolas a respeito de temas amorosos e sentimentais (Ovídio).

Nas epístolas do primeiro tipo, o tom pode variar muito, e as composições podem encerrar desde conselhos, reflexões e elogios até críticas mordazes.

Na Idade Média e no Renascimento, as epístolas foram cultivadas por grandes nomes da literatura universal, como Samuel Daniel, Petrarca, Ariosto e Boileau.

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Em português, talvez o exemplo mais célebre de epístolas em verso seja o das famosas Cartas chilenas, de Tomás Antônio Gonzaga, que abordaremos mais adiante.

Aplicação da epístola

Em geral, a epístola em verso presta-se a abordar, como nota J. A. Cuddon, ou temas morais e filosóficos, ou temas sentimentais.

Assim, as epístolas podem expressar opiniões, manifestos, relatos históricos, críticas ou simplesmente sentimentos, a depender do objetivo do autor, que colocará na epístola, contudo, uma mensagem direcionada a alguém.

Este alguém (destinatário) é, pois, elemento sempre presente na epístola, e pode consistir em um ou mais entes, sendo eles reais ou fictícios.

Em português, as epístolas são compostas tradicionalmente ou em versos brancos, ou em terza rima; o metro mais usado é o decassílabo.

Um bom exemplo de epístola portuguesa temos na Epístola a Critilo, atribuída a Cláudio Manuel da Costa, construída em decassílabos brancos e que assim começa:

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Vejo, ó Critilo, do Chileno Chefe
Tão bem pintada a história nos teus versos,
Que não sei decidir, qual seja a cópia,
Qual seja o original. Dentro em minha alma
Que diversas paixões, que afetos vários
A um tempo se suscitam! Gelo, e tremo
Umas vezes de horror, de mágoa, e susto,
Outras vezes do riso apenas posso
Resistir aos impulsos: igualmente
Me sinto vacilar entre os combates
Da raiva, e do prazer. Mas ah! que disse!
Eu retrato a expressão, nem me subscrevo
Ao sufrágio daquele, que assim pensa
Alheio da razão, que me surpreende.
(…)

Exemplos de epístola

Para exemplificar melhor o emprego da epístola na poesia portuguesa, utilizaremos as famosas Cartas chilenas, de Tomás Antônio Gonzaga.

Esta obra é composta por várias cartas satíricas (das quais conhecemos treze) construídas em decassílabos brancos, escritas em tom mordaz, agressivo e jocoso.

A obra se inicia com a seguinte observação:

Cartas chilenas

Em que se contam os sucessos
de todo o Governo de Fanfarrão Minésio,
General de Chile.
Escritas na língua Castelhana
pelo Poeta Critilo.
Traduzidas em Português,
e dedicadas
aos Grandes de Portugal
por um Anônimo.

O tal Poeta Critilo, suposto habitante de Santiago, é um personagem; o “tradutor” é declarado anônimo; Chile, em verdade, é paródia da própria Vila Rica e o tal Fanfarrão Minésio é ninguém menos que Luís da Cunha Meneses, o governador de Minas Gerais de então.

Abaixo citamos o início de uma das cartas.

Carta 9ª, de Tomás Antônio Gonzaga

Em que se contam as desordens,
que Fanfarrão obrou no governo das Tropas

Agora, Doroteu, agora estava
Bamboando na rede preguiçosa,
E tomando na fina porçolana
O mate saboroso, quando escuto
De grossa artilharia o rouco estrondo.
O sangue se congela, a casa treme,
E pesada porção de estuque velho
À violência do abalo despegada
Da barriguda esteira, faz que eu perca
A tigela esmaltada, que era a cousa,
Que tinha nesta casa de algum preço.
*
Apenas torno em mim daquele susto,
Me lembra ser o dia, em que o bom Chefe
Aos seus auxiliares lições dava,
Da que Saxe1 chamou pequena guerra.
Amigo Doroteu, não sou tão néscio,
Que os avisos de Jove não conheça.
Castigou, castigou o meu descuido,
Pois não me deu a veia de Poeta,
Nem me trouxe por mares empolados
A Chile, para que gostoso, e mole
Descanse o corpo na franjada rede.
*
Nasceu o sábio Homero entre os antigos,
Para o nome cantar do Grego Aquiles;2
Para cantar também ao Pio Eneias,
Teve o povo Romano o seu Virgílio.
Assim para escrever os grandes feitos,
Que nosso Fanfarrão obrou em Chile,
Entendo, Doroteu, que a Providência
Lançou na culta Espanha o teu Critilo.
Ora pois, Doroteu, eu passo, eu passo
A cumprir respeitoso os meus deveres.
E já que o meu Herói agora adestra
Esquadras belicosas, também hoje
Tomarei por empresa só mostrar-te
Que ele fez na milícia grandes cousas.
(…)

Bilhete postal, de Augusto dos Anjos

Também satírica é esta epístola de Augusto dos Anjos, que vem assinada por “O Poeta Raquítico” e é construída em dodecassílabos rimados.

Ilustre professor da Carta Aberta: — Almejo
Que uma alimentação a fiambre e a vinho e a queijo
Lhe fortaleça o corpo, e assim lhe fortaleça
As mãos, os pés, a perna et coetera e a cabeça.
Continue a comer como um monstro no almoço,
Inche como um balão, cresça como um colosso
E vá crescendo e vá crescendo e vá crescendo,
E fique do tamanho extraordinário e horrendo
Do célebre Titão e do Hércules lendário;
O seu ventre se torne um ventre extraordinário,
Cheio do cheiro ruim de fétidos resíduos;
As barrigas então de cinquenta indivíduos
Não poderão caber na sua ampla barriga.
Não mais lhe pesará a desgraça inimiga,
O seu nome também não será mais Antônio.
Todos hão de chamá-lo o colosso, o demônio,
A maravilha das brilhantes maravilhas.
As hienas carniçais, as leoas e as novilhas,
Diante do seu vigor recuarão e diante
Do estrídulo metal de sua voz atroante
De certo, correrão mansas e espavoridas.
Se as minhas orações, forem, pois, atendidas,
O senhor há de ser o Teseu do universo.
Seja um gigante, pois; não faça, porém, verso
De qualidade alguma e nem também me faça
Artigos tresandando a bolor e a cachaça,
Ricos de incorreções e de erros de gramática,
Tenha vergonha, esconda essa tendência asnática,
Que somente possui o seu cérebro obtuso —
Esconda-a, e nunca mais se exponha a fazer uso
Da pena, e nunca mais desenterre alfarrábios.
Os tolos, em geral, são tidos como sábios
Quando querem calar-se e reprimir-se sabem,
O senhor é papalvo e os papalvos não cabem
No centro literário e no centro político.
Respeite-me, portanto!

O Poeta Raquítico.

Como citar este conteúdo COMO FAZER UM POEMA. Epístola: o que é, características e exemplos. [S.I.] 2024. Disponível em: https://comofazerumpoema.com/epistola-o-que-e-caracteristicas-exemplos/. Acesso em: 26 out. 2024.