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Literatura de cordel: o que é, características e exemplos de poemas de cordel nordestinos

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Saiba o que é literatura de cordel, suas características, sua história e veja exemplos de poemas de cordel nordestinos!

A literatura de cordel é uma manifestação literária tradicional da cultura popular brasileira, que ganhou muita força em meados do século XX, especialmente nos estados nordestinos e no norte do Brasil.

Tendo alcançado grande sucesso nos estados de Alagoas, Ceará, Pernambuco, Paraíba, Pará e Rio Grande do Norte, a literatura de cordel é, por isso, vulgarmente conhecida como cordel nordestino.

Um grande número de autores destacaram-se compondo apenas cordéis, e pode-se dizer que, hoje, a literatura de cordel é uma das manifestações literárias mais tradicionais da cultura brasileira.

Sendo assim, preparamos esse artigo para que você conheça um pouco mais sobre a poesia de cordel, suas características, sua história, e entre em contato, também, com exemplos de poemas de cordel nordestino.

Boa leitura!

O que é literatura de cordel

A literatura de cordel (ou poesia de cordel) é um gênero literário popular destinado à declamação e impresso em folhetos.

O nome “cordel” deriva do fato de que estes folhetos geralmente são publicados em pequenas brochuras e pendurados por cordas (ou cordéis) nos pontos onde são vendidos.

Embora a literatura de cordel não se resuma apenas a poemas, são três os principais elementos deste gênero literário: a métrica, a rima e a oralidade.

Além disso, o cordel possui outras particularidades que abordaremos mais a seguir, mas não seria de todo incorreto dizer dele uma expressão poética autenticamente popular.

Tendo-se popularizado no Brasil nas regiões Norte e Nordeste, o cordel atuou e ainda atua como veículo de comunicação, protesto, crítica social, e também como ofício, havendo cordelistas que tiraram e ainda tiram sua fonte de renda através de seus poemas de cordel.

Não raro, os cordéis são vendidos acompanhados de outros elementos artísticos, como xilogravuras e ilustrações, que são estampadas na capa dos livretos.

História da literatura de cordel

A literatura de cordel é mais antiga do que se imagina e, ao contrário do que pode parecer, não foi criada no Brasil.

Esse gênero literário já existia entre os fenícios, cartaginenses, saxões e apareceu muito cedo na cultura greco-romana.

É sabido que também já havia literatura de cordel nos séculos XII em países como França e Itália, popularizando-se no Renascimento e disseminando-se na Espanha e Portugal por volta do século XVI.

No Brasil, estima-se que a literatura de cordel tenha chegado no final do século XVIII através dos colonizadores portugueses, que a introduziram na cidade de Salvador.

Na época, e não somente no Brasil, os cordéis eram majoritariamente vendidos em feiras pelos próprios poetas, portanto, desde o início, a literatura de cordel era dotada deste caráter popular.

O paraibano Leandro Gomes de Barros é tido como o primeiro poeta a publicar poemas de cordel no Brasil. Os poemas, aqui, eram chamados de “folhetos de cordel” e vendidos a baixo custo de mão em mão.

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A grande popularização destes folhetos, que apresentavam fortíssimo regionalismo e temáticas de cunho popular, permitiu que fosse criado um verdadeiro mercado para estas produções literárias, que ainda hoje possuem um público fiel em nosso país, mesmo após o advento de inúmeras novas mídias que fizeram com que enfraquecesse um pouco o caráter informativo, também característico da literatura de cordel.

Características da literatura de cordel

Podemos dizer que a literatura de cordel apresenta as seguintes características:

  • Regionalismo;
  • Oralidade;
  • Feita em versos;
  • Uso de rima;
  • Temática popular;
  • Linguagem predominantemente informal;
  • Impressão em livretos pendurados em cordas (ou cordéis).

A literatura de cordel, como dissemos, cumpria em grande parte o que hoje é feito por outros veículos de mídia, informando, criticando e, também, divertindo.

O seu regionalismo é característico uma vez que a poesia de cordel aborda temas políticos, folclóricos, episódios históricos e pertinentes à realidade social da região em que é publicado.

Geralmente, todos esses temas são abordados com bom humor, valendo-se o cordelista da boa e velha ironia, como também do sarcasmo.

Embora haja alguns autores que fizeram literatura de cordel em prosa, a literatura de cordel é tradicionalmente feita em versos.

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O uso da rima e da métrica naturalmente incentivam uma de suas características mais marcantes, a oralidade, e portanto são composições destinadas à declamação.

Somando-se à oralidade a temática popular e a linguagem informal, temos aí um bom resumo para a finalidade deste gênero literário, produzido para viver “na boca do povo”, e não descansando em prateleiras de bibliotecas.

Principais nomes do cordel no Brasil

Fundada em 1989, a Academia Brasileira de Literatura de Cordel reúne milhares de documentos com o objetivo de preservar e resgatar a poesia de cordel brasileira, disponibilizando material para extensa pesquisa.

Abaixo estão os nomes reconhecidos pela ABLC como grandes cordelistas:

  • Apolônio Alves dos Santos
  • Arievaldo Viana Lima
  • Cego Aderaldo
  • Elias A. de Carvalho
  • Expedito Sebastião da Silva
  • Firmino Teixeira do Amaral
  • Francisco das Chagas Batista
  • Francisco Sales Arêda
  • Gonçalo Ferreira da Silva
  • João Ferreira de Lima
  • João Martins de Athayde
  • João Melchíades Ferreira
  • Joaquim Batista de Sena
  • José Camelo de Melo Resende
  • José Costa Leite
  • José Pacheco
  • Leandro Gomes de Barros
  • Manoel Camilo dos Santos
  • Manoel d’Almeida Filho
  • Manoel Monteiro
  • Mestre Azulão
  • Patativa do Assaré
  • Raimundo Santa Helena
  • Severino Milanês
  • Silvino Pirauá
  • Zé da Luz
  • Zé Maria de Fortaleza

Exemplos de poemas de cordel nordestinos

Abaixo selecionamos alguns poemas de cordel nordestinos que estão entre os mais importantes da tradição cordelista brasileira.

Ai se sesse, de Zé da Luz

Se um dia nós se gostasse
Se um dia nós se queresse
Se nos dois se empareasse
Se juntin nós dois vivesse
Se juntin nós dois morasse
Se juntin nós dois durmisse
Se juntin nós dois morresse
Se pro céu nos assubisse

Mas porém acontecesse de São Pedro não abrisse
A porta do céu e fosse te dizer qualquer tolice
E se eu me arriminasse
E tu com eu insistisse pra que eu me aresolvesse
E a minha faca puxasse
E o bucho do céu furasse
Talvez que nos dois ficasse
Talvez que nos dois caísse
E o céu furado arriasse e as virgem todas fugisse

Proezas de João Grilo, de João Martins de Athayde

(…) João Grilo foi um cristão
que nasceu antes do dia
criou-se sem formosura
mas tinha sabedoria
e morreu depois da hora
pelas artes que fazia.

E nasceu de sete meses
chorou no bucho da mãe
quando ela pegou um gato
ele gritou: não me arranhe
não jogue neste animal
que talvez você não ganhe.

Na noite que João nasceu
houve um eclipse na lua
e detonou um vulcão
que ainda continua
naquela noite correu
um lobisomem na rua.

Porém João Grilo criou-se
pequeno, magro e sambudo
as pernas tortas e finas
e boca grande e beiçudo
no sítio onde morava
dava notícia de tudo. (…)

As Misérias da Época, de Leandro Gomes de Barros

Se eu soubesse que esse mundo
Estava tão corrompido
Eu tinha feito uma greve
Porém não tinha nascido
Minha mãe não me dizia
A queda da monarquia
Eu nasci, fui enganado
Pra viver neste mundo
Magro, trapilho, corcundo,
Além de tudo selado.

Assim mesmo meu avô
Quando eu pegava a chorar,
Ele dizia não chore
O tempo vai melhorar.
Eu de tolo acreditava
Por inocente esperava
Ainda me sentar num trono
Vovó para me distrair
Dizia tempo há de vir
Que dinheiro não tem dono.

Ser nordestino, de Bráulio Bessa

Sou o gibão do vaqueiro, sou cuscuz sou rapadura
Sou vida difícil e dura
Sou nordeste brasileiro
Sou cantador violeiro, sou alegria ao chover
Sou doutor sem saber ler, sou rico sem ser granfino
Quanto mais sou nordestino, mais tenho orgulho de ser
Da minha cabeça chata, do meu sotaque arrastado
Do nosso solo rachado, dessa gente maltratada
Quase sempre injustiçada, acostumada a sofrer
Mais mesmo nesse padecer eu sou feliz desde menino
Quanto mais sou nordestino, mais orgulho tenho de ser

Terra de cultura viva, Chico Anísio, Gonzagão de Renato Aragão
Ariano e Patativa. Gente boa, criativa
Isso só me dá prazer e hoje mais uma vez eu quero dizer
Muito obrigado ao destino, quanto mais sou nordestino
Mais tenho orgulho de ser.

O poeta da roça, de Patativa do Assaré

Sou fio das mata, cantô da mão grosa
Trabaio na roça, de inverno e de estio
A minha chupana é tapada de barro
Só fumo cigarro de paia de mio

Sou poeta das brenha, não faço o papé
De argum menestrê, ou errante cantô
Que veve vagando, com sua viola
Cantando, pachola, à percura de amô

Não tenho sabença, pois nunca estudei
Apenas eu seio o meu nome assiná
Meu pai, coitadinho! vivia sem cobre
E o fio do pobre não pode estudá

Meu verso rastero, singelo e sem graça
Não entra na praça, no rico salão
Meu verso só entra no campo da roça e dos eito
E às vezes, recordando feliz mocidade
Canto uma sodade que mora em meu peito

Cartilha do povo, de Raimundo Santa Helena

(…) Contestação não é crime
Onde há democracia
Só ao cidadão pertence
A sua soberania
No poder coercitivo
Jesus foi subversivo
Na versão da tirania.

Eu sou dono do meu passe
Faço arte sem patrão
Só quem tem capacidade
Deve ser oposição
Porque lutar pelos fracos
É tatear nos buracos
Na densa escuridão.

Peleja do Cego Aderaldo com Zé Pretinho dos Tucuns, de Firmino Teixeira do Amaral

(…)Apreciem, meus leitores,
Uma forte discussão,
Que tive com Zé Pretinho,
Um cantador do sertão,
O qual, no tanger do verso,
Vencia qualquer questão.

Um dia, determinei
A sair do Quixadá —
Uma das belas cidades
Do estado do Ceará.
Fui até o Piauí,
Ver os cantores de lá.

Me hospedei na Pimenteira
Depois em Alagoinha;
Cantei no Campo Maior,
No Angico e na Baixinha.
De lá eu tive um convite
Para cantar na Varzinha.

Quando cheguei na Varzinha,
Foi de manhã, bem cedinho;
Então, o dono da casa
Me perguntou sem carinho:
— Cego, você não tem medo
Da fama do Zé Pretinho?

Eu lhe disse: — Não, senhor,
Mas da verdade eu não zombo!
Mande chamar esse preto,
Que eu quero dar-lhe um tombo —
Ele chegando, um de nós
Hoje há de arder o lombo!(…)

Bônus: poesia de cordel infantil

Como não poderia deixar de ser diferente em um gênero popular, o cordel expandiu-se de diversas maneiras e há, hoje, livros e outros conteúdos com poesia de cordel infantil.

Sem dúvida, os poemas de cordel infantil podem ser uma ótima porta de entrada para que as crianças se interessem e adentrem o vastíssimo universo literário.

Sendo assim, deixaremos algumas indicações para você que deseja introduzir crianças na literatura de cordel.

Em primeiro lugar, recomendamos os livros “Nina no cerrado” (Oficina dos Textos) e “A pedra do meio-dia ou Artur e Isadora” (Editora 34).

A primeira obra conta a história do cerrado através de poemas de cordel, com bonitas ilustrações de animais, frutos e paisagens, e é excelente para instigar a imaginação do público infantil, uma vez que a linguagem empregada é simples e cheia de detalhes.

A segunda obra é uma narrativa toda em forma de cordel destinada ao público infantil que, resumidamente, conta a história de Artur, um andarilho valente que salva a bela Isadora das garras de uma onça.

E para fechar, deixamos abaixo dois vídeos: o primeiro, da famosa fábula de Esopo, “A cigarra e a Formiga”, narrada em forma de cordel; o segundo, do pequeno cordelista João Neto declamando um poema de cordel sobre ser criança:

Conclusão

Ficamos por aqui!

Esperamos que tenha gostado do nosso artigo e aprendido um pouco mais sobre a literatura de cordel.

Se você curtiu esse conteúdo, não deixe de ver a nossa lista com os melhores livros para aprender e estudar poesia.

Um abraço e até a próxima!

Como citar este conteúdo COMO FAZER UM POEMA. Literatura de cordel: o que é, características e exemplos de poemas de cordel nordestinos. [S.I.] 2022. Disponível em: https://comofazerumpoema.com/literatura-de-cordel-poemas-cordel-nordestino/. Acesso em: 3 mai. 2024.