Conheça o poema Os sapos, de Manuel Bandeira, e confira nossa análise!
O poema Os sapos, de Manuel Bandeira, é um dos poemas mais conhecidos da literatura brasileira e está presente em qualquer livro didático sobre este tema.
Publicado pela primeira vez em 1919, na obra Carnaval, o poema destaca-se, sobretudo, por apresentar uma ironia corrosiva ao movimento conhecido como Parnasianismo no Brasil.
Boa parte da fama e da importância de Os sapos é decorrente de sua leitura na Semana de Arte Moderna de 1922, que provocou grande polêmica.
Após a enorme repercussão desta leitura, rapidamente o poema tornou-se talvez o maior símbolo do Modernismo no Brasil, convertendo-se, assim, num clássico da literatura brasileira e importantíssimo marco histórico.
Sendo assim, preparamos esse texto para que você conheça Os sapos, de Manuel Bandeira. Em seguida, você poderá conferir nossa análise do poema.
Boa leitura!
Os sapos, de Manuel Bandeira
Enfunando os papos,
Saem da penumbra,
Aos pulos, os sapos.
A luz os deslumbra.Em ronco que aterra,
Berra o sapo-boi:
— “Meu pai foi à guerra!”
— “Não foi!” — “Foi!” — “Não foi!”O sapo-tanoeiro,
Parnasiano aguado,
Diz: — “Meu cancioneiro
É bem martelado.Vede como primo
Em comer os hiatos!
Que arte! E nunca rimo
Os termos cognatos.O meu verso é bom
Frumento sem joio.
Faço rimas com
Consoantes de apoio.Vai por cinquenta anos
Que lhes dei a norma:
Reduzi sem danos
A formas a forma.”Clame a saparia
Em críticas céticas:
“Não há mais poesia,
Mas há artes poéticas…”Urra o sapo-boi:
— “Meu pai foi rei” — “Foi!”
— “Não foi!” — “Foi!” — “Não foi!”Brada em um assomo
O sapo-tanoeiro:
— “A grande arte é como
Lavor de joalheiro.Ou bem de estatuário.
Tudo quanto é belo,
Tudo quando é vário,
Canta no martelo.”Outros, sapos-pipas
(Um mal em si cabe),
Falam pelas tripas:
— “Sei!” — “Não sabe!” — “Sabe!”Longe dessa grita,
Lá onde mais densa
A noite infinita
Verte a sombra imensa;Lá, fugido ao mundo,
Sem glória, sem fé,
No porão profundo
E solitário, éQue soluças tu,
Transido de frio,
Sapo-cururu
Da beira do rio…
Análise do poema
- Tipo de verso: pentassílabo rimado (redondilha menor)
- Número e tipo de estrofes: 14 estrofes: 13 quadras e 1 terceto.
- Número de versos: 55 versos
Os sapos é um poema construído em pentassílabos rimados, portanto, é um poema que utiliza metrificação e rima.
Esse tipo de verso possui 5 sílabas poéticas e é conhecido, em português, como redondilha menor.
Estrutura do poema
O poema Os sapos possui 55 versos, divididos em 14 estrofes: 13 quadras e 1 terceto.
Em relação às rimas, as quadras utilizam o que chamamos de rimas cruzadas, alternadas ou entrelaçadas, e se apresentam conforme o esquema abab.
Já no terceto único do poema, há apenas uma rima para os três versos.
É interessante observar que este terceto é inserido inesperadamente após 7 quadras em sequência, que pareciam sugerir que o poema seria composto inteiramente de estrofes regulares de quatro versos.
Há, pois, uma ruptura estrutural no poema graças a este terceto.
Tal disposição parece também sugerir uma pausa, uma ênfase após a leitura desta estrofe, especialmente quando notamos que ela é aberta com um sapo “urrando” e seus versos parecem exclamar rapidamente uma enxurrada de aliterações e assonâncias.
Sentido do poema
Os sapos é, em suma, um poema irônico que busca satirizar as convenções poéticas em voga no tempo de Manuel Bandeira, nomeadamente, o Parnasianismo.
No poema, são apresentados vários tipo de “sapos”, sendo cada um a metáfora para um tipo específico de poeta.
Já na primeira estrofe, vemos que o eu lírico apresenta-nos ridicularizando os tais sapos, que “saem da penumbra”, “aos pulos”, “enfunando os papos”, porque “a luz os deslumbra”.
Com isso, quer-nos dizer o eu lírico que são os “sapos” frívolos, vaidosos e sedentos por fama.
Em seguida, após mostrar a postura arrogante do “sapo-boi”, o eu lírico apresenta-nos o “sapo-tanoeiro”, que é uma paródia de Olavo Bilac, um dos medalhões da literatura brasileira.
Este sapo faz dois discursos no poema: no primeiro deles, exalta, simultaneamente, a forma e a si mesmo, mostrando um vistoso esnobismo; já no segundo, diz que “a grande arte é como lavor de joalheiro”, referência direta ao poema Profissão de fé, em que Bilac compara o trabalho do poeta com o de um ourives.
Abaixo alguns versos deste poema de Bilac:
Torce, aprimora, alteia, lima
A frase; e, enfim,
No verso de ouro engasta a rima,
Como um rubim.Quero que a estrofe cristalina,
Dobrada ao jeito
Do ourives, saia da oficina
Sem um defeito
Fica, portanto, evidente que o que faz o eu lírico ao longo do poema é criticar de forma bem humorada o preciosismo dos parnasianos, e representa-os como diferentes sapos, cada qual vaidoso à sua maneira.
Por fim, nas três últimas estrofes, o eu lírico apresenta-nos um outro tipo de sapo, “solitário”, “fugido ao mundo”, “sem glória, nem fé”: o “sapo-cururu”.
Este sapo, parece, simboliza o que para Bandeira é o poeta autêntico: o poeta simples, solitário, que não se preocupa com formalidades nem prestígio; mas que, estando “lá onde mais densa a noite infinita verte a sombra imensa”, sente verdadeiramente a existência e tem algo a dizer.
Vemos, assim, que o poema Os sapos, além de fazer uma crítica severa aos poetas parnasianos, parece nos dizer que, em poesia, o conteúdo é mais importante do que a forma.
Os sapos, Semana de Arte Moderna e Modernismo
A Semana de Arte Moderna, também chamada de Semana de 22, ocorreu em São Paulo, entre os dias 13 e 17 de fevereiro de 1922, no Teatro Municipal da cidade.
Este evento representou uma tentativa de renovação da linguagem artística e cultural e teve como pilares a experimentação, a liberdade criadora e a ruptura simultânea com as convenções e com o passado, consagrando no Brasil o movimento que ficou conhecido como Modernismo.
No dia 15 de fevereiro, o poema Os sapos, de Manuel Bandeira, foi declamado por Ronald de Carvalho, em meio a vaias e gritos da plateia.
Tal leitura suscitou grande polêmica e foi, pode-se dizer, o grande momento da Semana de Arte Moderna.
A partir deste dia, Os sapos tornou-se como um estandarte do movimento modernista e incentivou inúmeros outros poetas a romperem com as convenções poéticas de então.
Sobre Manuel Bandeira
Manuel Bandeira nasceu em Recife, em 19 de abril de 1886.
Além de poeta, foi professor, cronista, crítico literário e professor.
Aos dez anos, deixou Recife com destino ao Rio de Janeiro, onde, de 1897 a 1902, cursou o secundário no colégio hoje chamado Pedro II, bacharelando-se em letras.
Em 1903, matriculou-se na Escola Politécnica de São Paulo para fazer o curso de engenheiro-arquiteto, abandonando-o no ano seguinte por sofrer de tuberculose.
A doença levou-o a vários sanatórios e fê-lo mudar seguidamente de cidade. Entre 1913 a 1914, esteve recuperando-se em Clavadel, na Suíça.
Parecia a tuberculose sugerir que seria curta a vida do jovem poeta; mas, curiosamente, viveu ele até os 82 anos.
Retornando da Suíça ao Brasil, Manuel Bandeira iniciou sua produção literária em periódicos. Em 1917, publicou sua primeira obra, A cinza das horas, e dali em diante passaria os seus anos em intensa produção artística, dando luz a uma das mais ricas obras da poesia moderna brasileira.
Em 1940, foi eleito para a cadeira 24 da Academia Brasileira de Letras.
Em 13 de outubro de 1968, faleceu, célebre e amplamente considerado um dos maiores poetas da literatura brasileira.
Obras poéticas de Manuel Bandeira
- A cinza das horas (1917)
- Carnaval (1919)
- O ritmo dissoluto (1924)
- Libertinagem (1930)
- Estrela da manhã (1936)
- Lira dos cinquent’anos (1940)
- Belo belo (1948)
- Mafuá do Malungo (1948)
- Opus 10 (1954)
- Estrela da tarde (1960)
Bônus: animação sobre o poema Os sapos, de Manuel Bandeira
Conclusão
Ficamos por aqui!
Esperamos que você tenha gostado de nossa análise do poema Os sapos, de Manuel Bandeira.
Se você curtiu esse conteúdo, não deixe de ver a nossa coletânea de poemas sobre a água.
Um abraço e até a próxima!