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Poema O navio negreiro, de Castro Alves (com análise)

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Conheça o poema O navio negreiro, de Castro Alves, e confira nossa análise!

O navio negreiro é um poema assinado pelo brasileiro Castro Alves, que foi talvez o poeta mais aclamado em toda história do Brasil.

Este poema mostra-nos um dos traços mais marcantes de Castro Alves: a luta apaixonada pelas ideias abolicionistas, que lhe valeram a alcunha de “poeta dos escravos”.

Castro Alves bem se ocupou de outros problemas sociais de seu tempo, mas parece mesmo que sua glória veio em razão de colocar em versos as ideias abolicionistas que se agitavam naqueles anos, e que o tocaram quando ainda estudante da Faculdade de Direito.

O navio negreiro foi parte importante deste processo que consagrou Castro Alves como símbolo da voz popular de sua geração.

Como conta-nos a Academia Brasileira de Letras, “só Castro Alves estenderia sobre o negro o manto redentor da poesia, tratando-o como herói, como ser integralmente humano”.

Dito isso, preparamos esse texto para que você conheça o poema O navio negreiro, de Castro Alves. Em seguida, você poderá conferir nossa análise.

Boa leitura!

O navio negreiro, de Castro Alves

I

’Stamos em pleno mar… Doido no espaço
Brinca o luar — dourada borboleta —
E as vagas após ele correm… cansam
Como turba de infantes inquieta.

’Stamos em pleno mar… Do firmamento
Os astros saltam como espumas de ouro…
O mar em troca acende as ardentias
— Constelações do líquido tesouro…

’Stamos em pleno mar… Dois infinitos
Ali se estreitam num abraço insano
Azuis, dourados, plácidos, sublimes…
Qual dos dois é o céu? Qual o oceano?…

’Stamos em pleno mar… Abrindo as velas
Ao quente arfar das virações marinhas,
Veleiro brigue corre à flor dos mares,
Como roçam na vaga as andorinhas…

Donde vem?… Onde vai?… Das naus errantes
Quem sabe o rumo se é tão grande o espaço?
Neste Saara os corcéis o pó levantam,
Galopam, voam, mas não deixam traço.

Bem feliz quem ali pode nest’hora
Sentir deste painel a majestade!…
Embaixo — o mar… em cima — o firmamento…
E no mar e no céu — a imensidade!

Oh! que doce harmonia traz-me a brisa!
Que música suave ao longe soa!
Meu Deus! Como é sublime um canto ardente
Pelas vagas sem fim boiando à toa!

Homens do mar! Ó rudes marinheiros
Tostados pelo sol dos quatro mundos!
Crianças que a procela acalentara
No berço destes pélagos profundos!

Esperai! Esperai! deixai que eu beba
Esta selvagem, livre poesia…
Orquestra — é o mar que ruge pela proa,
E o vento que nas cordas assobia…

……………………………………………………………………..

Por que foges assim, barco ligeiro?
Por que foges do pávido poeta?
Oh! quem me dera acompanhar-te a esteira
Que semelha no mar — doido cometa!

Albatroz! Albatroz! águia do oceano,
Tu, que dormes das nuvens entre as gazas,
Sacode as penas, Leviatã do espaço!
Albatroz! Albatroz! dá-me estas asas…

II

Que importa do nauta o berço,
Donde é filho, qual seu lar?…
Ama a cadência do verso
Que lhe ensina o velho mar!
Cantai! que a noite é divina!
Resvala o brigue à bolina
Como um golfinho veloz.
Presa ao mastro da mezena
Saudosa bandeira acena
Às vagas que deixa após.

Do espanhol as cantilenas
Requebradas de langor,
Lembram as moças morenas,
As andaluzas em flor.
Da Itália o filho indolente
Canta Veneza dormente
— Terra de amor e traição —
Ou do golfo no regaço
Relembra os versos do Tasso
Junto às lavas do vulcão!

O inglês — marinheiro frio,
Que ao nascer no mar se achou —
(Porque a Inglaterra é um navio,
Que Deus na Mancha ancorou),
Rijo entoa pátrias glórias,
Lembrando orgulhoso histórias
De Nelson e de Aboukir.
O francês — predestinado —
Canta os louros do passado
E os loureiros do porvir…

Os marinheiros helenos,
Que a vaga iônia criou,
Belos piratas morenos
Do mar que Ulisses cortou,
Homens que Fídias talhara,
Vão cantando em noite clara
Versos que Homero gemeu…
…Nautas de todas as plagas!
Vós sabeis achar nas vagas
As melodias do céu…

III

Desce do espaço imenso, ó águia do oceano!
Desce mais, inda mais… não pode o olhar humano
Como o teu mergulhar no brigue voador.
Mas que vejo eu ali… que quadro de amarguras!
É canto funeral!… Que tétricas figuras!…
Que cena infame e vil!… Meu Deus! meu Deus! Que horror!

IV

Era um sonho dantesco… O tombadilho
Que das luzernas avermelha o brilho,
Em sangue a se banhar.
Tinir de ferros… estalar do açoite…
Legiões de homens negros como a noite,
Horrendos a dançar…

Negras mulheres, suspendendo às tetas
Magras crianças, cujas bocas pretas
Rega o sangue das mães:
Outras, moças… mas nuas e espantadas,
No turbilhão de espectros arrastadas,
Em ânsia e mágoa vãs.

E ri-se a orquestra irônica, estridente…
E da ronda fantástica a serpente
Faz doidas espirais…
Se o velho arqueja… se no chão resvala,
Ouvem-se gritos… o chicote estala.
E voam mais e mais…

Presa nos elos de uma só cadeia,
A multidão faminta cambaleia,
E chora e dança ali!
……………………………………………………………………
Um de raiva delira, outro enlouquece…
Outro, que de martírios embrutece,
Cantando, geme e ri!

No entanto o capitão manda a manobra
E após, fitando o céu que se desdobra
Tão puro sobre o mar,
Diz do fumo entre os densos nevoeiros:
“Vibrai rijo o chicote, marinheiros!
Fazei-os mais dançar!…”

E ri-se a orquestra irônica, estridente…
E da ronda fantástica a serpente
Faz doidas espirais!
Qual num sonho dantesco as sombras voam…
Gritos, ais, maldições, preces ressoam!
E ri-se Satanás!…

V

Senhor Deus dos desgraçados!
Dizei-me vós, Senhor Deus!
Se é loucura… se é verdade
Tanto horror perante os céus…
Ó mar! por que não apagas
Co’a esponja de tuas vagas
De teu manto este borrão?…
Astros! noite! tempestades!
Rolai das imensidades!
Varrei os mares, tufão!…

Quem são estes desgraçados,
Que não encontram em vós,
Mais que o rir calmo da turba
Que excita a fúria do algoz?
Quem são?… Se a estrela se cala,
Se a vaga à pressa resvala
Como um cúmplice fugaz,
Perante a noite confusa…
Dize-o tu, severa musa,
Musa libérrima, audaz!

São os filhos do deserto
Onde a terra esposa a luz.
Onde voa em campo aberto
A tribo dos homens nus…
São os guerreiros ousados,
Que com os tigres mosqueados
Combatem na solidão…
Homens simples, fortes, bravos…
Hoje míseros escravos,
Sem ar, sem luz, sem razão…

São mulheres desgraçadas
Como Agar o foi também,
Que sedentas, alquebradas,
De longe… bem longe vêm…
Trazendo com tíbios passos,
Filhos e algemas nos braços,
N’alma — lágrimas e fel.
Como Agar sofrendo tanto
Que nem o leite de pranto
Têm que dar para Ismael…

Lá nas areias infindas,
Das palmeiras no país,
Nasceram — crianças lindas,
Viveram — moças gentis…
Passa um dia a caravana
Quando a virgem na cabana
Cisma da noite nos véus …
…Adeus! ó choça do monte!…
…Adeus! palmeiras da fonte!…
…Adeus! amores… adeus!…

Depois o areal extenso…
Depois o oceano de pó…
Depois no horizonte imenso
Desertos… desertos só…
E a fome, o cansaço, a sede…
Ai! quanto infeliz que cede,
E cai pra não mais s’erguer!…
Vaga um lugar na cadeia,
Mas o chacal sobre a areia
Acha um corpo que roer…

Ontem a Serra Leoa,
A guerra, a caça ao leão,
O sono dormido à toa
Sob as tendas d’amplidão…
Hoje… o porão negro, fundo,
Infecto, apertado, imundo,
Tendo a peste por jaguar…
E o sono sempre cortado
Pelo arranco de um finado,
E o baque de um corpo ao mar…

Ontem plena liberdade,
A vontade por poder…
Hoje… cúm’lo de maldade,
Nem são livres pra… morrer…
Prende-os a mesma corrente
— Férrea, lúgubre serpente —
Nas roscas da escravidão.
E assim roubados à morte,
Dança a lúgubre coorte
Ao som do açoite… Irrisão!…

Senhor Deus dos desgraçados!
Dizei-me vós, Senhor Deus!
Se eu deliro… ou se é verdade
Tanto horror perante os céus…
Ó mar, por que não apagas
Co’a esponja de tuas vagas
De teu manto este borrão?…
Astros! noite! tempestades!
Rolai das imensidades!
Varrei os mares, tufão!…

VI

E existe um povo que a bandeira empresta
Pra cobrir tanta infâmia e covardia!…
E deixa-a transformar-se nessa festa
Em manto impuro de bacante fria!…
Meu Deus! meu Deus! mas que bandeira é esta,
Que impudente na gávea tripudia?!…
Silêncio!… Musa! chora, chora tanto
Que o pavilhão se lave no teu pranto…

Auriverde pendão de minha terra,
Que a brisa do Brasil beija e balança,
Estandarte que a luz do sol encerra,
E as promessas divinas da esperança…
Tu, que da liberdade após a guerra,
Foste hasteado dos heróis na lança,
Antes te houvessem roto na batalha,
Que servires a um povo de mortalha!…

Fatalidade atroz que a mente esmaga!
Extingue nesta hora o brigue imundo
O trilho que Colombo abriu na vaga,
Como um íris no pélago profundo!…
…Mas é infâmia demais… Da etérea plaga
Levantai-vos, heróis do Novo Mundo…
Andrada! arranca esse pendão dos ares!
Colombo! fecha a porta de teus mares!

Análise do poema

O navio negreiro é um poema inteiramente metrificado e que utiliza rima na maior parte dos versos.

O poema é dividido em seis partes, que dramatizam as condições desumanas em que as pessoas escravizadas eram transportadas da África até o Brasil através do oceano Atlântico.

Cada uma dessas partes possui uma estrutura própria, isto é, uma métrica própria e uma disposição própria de rimas e estrofes.

Estrutura do poema

O navio negreiro possui 240 versos divididos em 34 estrofes irregulares, que variam a depender de em qual das seis partes do poema estão inseridas.

Abaixo faremos a análise estrutural individualizada para cada uma destas partes.

Primeira parte

A primeira parte de O navio negreiro possui 44 versos divididos em 11 quadras (ou quartetos).

Os versos desta parte são decassílabos, ou seja, possuem, cada um deles, dez sílabas poéticas.

Quanto às rimas, nesta parte as quadras entremeiam versos rimados com versos brancos, de forma que o primeiro e o terceiro verso não rimam, enquanto o segundo rima com o quarto.

Segunda parte

A segunda parte de O navio negreiro possui 40 versos divididos em 4 décimas (estrofe de dez versos).

Os versos desta parte são heptassílabos, ou seja, possuem, cada um deles, sete sílabas poéticas. Estes versos também são chamados de redondilhas maiores.

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Quanto às rimas, os quatro primeiros versos destas décimas utilizam rimas alternadas, o quinto e o sexto verso rimas emparelhadas, e os quatro últimos versos rimas que chamamos enlaçadas.

O esquema final destas décimas é ababccdeed.

Terceira parte

A terceira parte de O navio negreiro possui 6 versos divididos em uma única estrofe, que chamamos de sextilha (ou sexteto).

Os versos desta parte são dodecassílabos, ou seja, possuem, cada um deles, doze sílabas poéticas. Estes versos também são chamados alexandrinos.

Vale ressaltar que Castro Alves utiliza versos considerados alexandrinos clássicos, por estarem conforme as seguintes regras: a sexta sílaba é sempre acentuada e nunca pertencente a vocábulo esdrúxulo; se pertencente a vocábulo grave, a última sílaba desta palavra termina em vogal que se elide na palavra seguinte.

Quanto às rimas, os dois primeiros versos desta sextilha única utilizam rimas emparelhadas e os quatro últimos versos rimas enlaçadas, conforme o esquema aabccb.

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Quarta parte

A quarta parte de O navio negreiro possui 36 versos divididos em 6 sextilhas.

Os versos desta parte são decassílabos, ou seja, possuem, cada um deles, dez sílabas poéticas.

Nesta parte, Castro Alves utiliza também o que chamamos versos quebrados, isto é, entremeiam os decassílabos alguns hexassílabos (versos de seis sílabas poéticas).

Quanto às rimas, todas as sextilhas desta parte se apresentam conforme o esquema aabccb.

Quinta parte

A quinta parte de O navio negreiro possui 90 versos divididos em 9 décimas.

Os versos desta parte são heptassílabos, ou seja, possuem, cada um deles, sete sílabas poéticas. Estes versos também são chamados de redondilhas maiores.

Quanto às rimas, esta parte, majoritariamente, segue o mesmo padrão das décimas da segunda parte: os quatro primeiros versos utilizam rimas alternadas, o quinto e o sexto verso rimas emparelhadas, e os quatro últimos versos rimas que chamamos enlaçadas.

O esquema final das rimas, pois, é ababccdeed.

Porém, há nesta parte algumas variações para este padrão: a primeira é que logo na primeira estrofe o poeta utiliza rimas toantes no primeiro e terceiro verso (ou seja, rima somente as vogais tônicas); a segunda é que, na estrofe seguinte o primeiro verso não rima com o terceiro, o que indica um provável descuido do poeta, ou que estes versos ainda não estavam finalizados.

Sexta parte

A sexta parte de O navio negreiro possui 24 versos divididos em 3 oitavas (estrofe de oito versos).

Os versos desta parte são decassílabos, ou seja, possuem, cada um deles, dez sílabas poéticas.

Quanto às rimas, os seis primeiros versos destas oitavas utilizam rimas alternadas e os últimos dois versos rimas emparelhadas, conforme o esquema abababcc.

Sentido do poema

O navio negreiro, na versão original, tinha como subtítulo “Tragédia no mar”, o que nos diz bastante sobre o seu sentido.

Este poema foi escrito provavelmente em 1868, quase 18 anos após a promulgação da lei Eusébio de Queirós, que proibia o tráfico de escravos: portanto, O navio negreiro foi como uma denúncia de que a lei não estava sendo cumprida.

Resumidamente, O navio negreiro é uma narrativa em que o eu lírico expõe a desumanidade das condições a que os africanos escravizados eram submetidos.

Primeira parte

A primeira parte de O navio negreiro é uma representação poética do cenário em que o poema será inserido: o alto-mar.

Propositalmente, tal cenário é pintado em toda a sua beleza e majestade: o luar, o firmamento, as estrelas… tudo isso é descrito a fim de gerar-nos um sentimento prazeroso.

O eu lírico, também, coloca os verbos na segunda pessoa do plural: “‘Stamos em pleno mar…”, e não “Estou em pleno mar”, ou “Estavam em pleno mar”; com isso, quer ele inserir-se e inserir-nos no poema, para que possamos sentir mais vivamente aquilo que será narrado.

Na quarta quadra, fica bem evidente a intenção do autor:

Bem feliz quem ali pode nest’hora
Sentir deste painel a majestade!…
Embaixo – o mar… em cima – o firmamento…
E no mar e no céu – a imensidade!

Tal “painel” contrastará violentamente com o que será descrito mais adiante.

Segunda parte

A segunda parte de O navio negreiro é destinada a apresentar aquele que conduz o navio.

Na verdade, nessa apresentação, o eu lírico não define exatamente alguém a conduzi-lo, como se isso não importasse.

Em contrapartida, faz ele uma descrição de nautas de diferentes nacionalidades, destacando algumas de suas características, mas evidenciando o que todos eles têm em comum:

Que importa do nauta o berço,
Donde é filho, qual seu lar?
Ama a cadência do verso
Que lhe ensina o velho mar!
Cantai! que a noite é divina!
Resvala o brigue à bolina
Como golfinho veloz.
Presa ao mastro da mezena
Saudosa bandeira acena
Às vagas que deixa após.

Terceira parte

A terceira parte de O navio negreiro é uma estrofe única que marca um ponto de inflexão na narrativa que, até então, era conduzida de maneira agradável.

O eu lírico convoca uma “águia” para, descendo do céu, reparar o que se passa dentro do navio. O que quer o eu lírico é que nós mesmos nos atentemos para o que lá ocorre e será descrito em sequência.

A estrofe é finalizada em tom de assombro:

Desce do espaço imenso, ó águia do oceano!
Desce mais… inda mais… não pode olhar humano
Como o teu mergulhar no brigue voador!
Mas que vejo eu aí… Que quadro d’amarguras!
É canto funeral!… Que tétricas figuras!…
Que cena infame e vil… Meu Deus! meu Deus! Que horror!

Quarta parte

A quarta parte de O navio negreiro talvez seja a mais chocante de todo o poema.

Finalmente entendemos por que o espanto no fechamento da parte anterior: o eu lírico, nesta parte, pinta a situação dramática e horrível dentro do navio.

As pessoas escravizadas estão acorrentadas, famintas e “dançam” enquanto vão sendo açoitadas.

Há sangue, mulheres nuas, crianças magras… enfim, é todo um painel horrível e desumano. Mas o mais espantoso é a postura cruel e sarcástica do capitão diante disso tudo, descrita na quinta estrofe desta parte:

No entanto o capitão manda a manobra,
E após, fitando o céu que se desdobra,
Tão puro sobre o mar,
Diz do fumo entre os densos nevoeiros:
“Vibrai rijo o chicote, marinheiros!
Fazei-os mais dançar!…”

Quinta parte

Na quinta parte de O navio negreiro o eu lírico, comovido e revoltado, coloca-se ao lado dos escravizados e dirige-se a Deus.

Nesta parte, a vida destas pessoas é posta em foco e o eu lírico dramatiza o fato de que aqueles que foram um dia “crianças lindas” e “moças gentis”, agora habitam o “porão negro, fundo, infecto, apertado, imundo”.

Esta quinta parte é aberta e fechada com a mesma estrofe, que é simultaneamente um protesto e uma súplica:

Senhor Deus dos desgraçados!
Dizei-me vós, Senhor Deus,
Se eu deliro… ou se é verdade
Tanto horror perante os céus?!…
Ó mar, por que não apagas
Co’a esponja de tuas vagas
Do teu manto este borrão?
Astros! noites! tempestades!
Rolai das imensidades!
Varrei os mares, tufão!…

Sexta parte

Na sexta e última parte de O navio negreiro, o eu lírico mantém o tom de protesto, mas desta vez direciona-o ao Brasil, que contribuía para que fossem perpetrados os horrores da escravidão:

Existe um povo que a bandeira empresta
P’ra cobrir tanta infâmia e cobardia!…
E deixa-a transformar-se nessa festa
Em manto impuro de bacante fria!…
Meu Deus! meu Deus! mas que bandeira é esta,
Que impudente na gávea tripudia?
Silêncio, Musa… Chora, e chora tanto
Que o pavilhão se lave no teu pranto!…

Auriverde pendão de minha terra,
Que a brisa do Brasil beija e balança,
Estandarte que a luz do sol encerra
E as promessas divinas da esperança…
Tu que, da liberdade após a guerra,
Foste hasteado dos heróis na lança,
Antes te houvessem roto na batalha,
Que servires a um povo de mortalha!…

Portanto, O navio negreiro é finalizado com a mensagem de que é inadmissível para um país como o Brasil, que conquistou a liberdade e que tem um passado de “heróis”, permitir-se utilizado para “cobrir tanta infâmia e cobardia”.

Sobre Castro Alves

Castro Alves nasceu em 14 de março de 1847, em Muritiba (BA).

Seu interesse pela poesia começou na infância, quando estudava na Escola do Barão de Macaúbas.

Cursou direito na Faculdade de Direito do Recife, quando foi tocado pelas ideias abolicionistas e começou a ser conhecido pelos seus versos.

Ficou especialmente popular pelo cunho social de sua poesia, que o tornou célebre e valeu-lhe apelidos como “poeta dos escravos” e “poeta republicano”.

Faleceu em Salvador (BA), com apenas 24 anos, vítima de tuberculose.

Obras de Castro Alves

  • Espumas flutuantes (1870)
  • Gonzaga, ou a revolução de Minas (1875)
  • A Cachoeira de Paulo Afonso (1876)
  • Os escravos (1883)
  • Obra completa (1960)

Conclusão

Ficamos por aqui!

Esperamos que você tenha gostado de nossa análise do poema O navio negreiro, de Castro Alves.

Se você curtiu esse conteúdo, não deixe de ver o que escrevemos sobre As borboletas, de Vinícius de Moraes.

Um abraço e até a próxima!