Saiba o que é hexassílabo em poesia, conheça suas características e veja exemplos de sua aplicação!
O hexassílabo é um tipo de verso de boa ocorrência em língua portuguesa, e aparece o mais das vezes em estrofes heterométricas, associado ao decassílabo.
Assim como o pentassílabo, este metro já apresenta possibilidades rítmicas mais abundantes que os metros menores, e em razão disso é também empregado como verso autônomo.
A seguir, elucidaremos o que é hexassílabo na poesia, quais são suas características e daremos exemplos de sua aplicação.
Definição de hexassílabo
Em poesia, hexassílabo é o nome que se dá ao verso que possui seis sílabas poéticas, segundo a contagem silábica praticada em português.
Nesta contagem, também chamada contagem francesa ou contagem de Castilho, considera-se para efeito de definição do metro o número de sílabas poéticas do verso até sua última sílaba tônica.
Desta forma, o hexassílabo pode possuir seis, sete ou oito sílabas poéticas reais, a depender se sua última sílaba tônica recai em palavra aguda, grave ou esdrúxula, respectivamente.
Este verso é também conhecido como heroico quebrado ou heroico menor, em razão de ser utilizado em estrofes heterométricas junto ao decassílabo.
Quanto à acentuação, o verso hexassílabo possui, normalmente, duas ou três sílabas fortes.
Características do verso hexassílabo
O hexassílabo começou a ser empregado em português associado ao decassílabo, por influência da poesia italiana, onde estes versos eram frequentemente associados a fim de conferir dinamismo aos poemas.
Sá de Miranda, Camões e outros já o empregaram nestas condições.
Modernamente, o hexassílabo passou a ser também utilizado em estrofes isométricas, embora a tradicional utilização como metro secundário tenha perdurado até nossos dias.
Tipos de hexassílabo
Em geral, o hexassílabo apresenta-se em três modelos rítmicos básicos, que exemplificaremos abaixo, apresentando também as suas variações.
A maioria das vezes, especialmente em estrofes isométricas, estes modelos misturam-se ao longo da composição; mas encontramos, contudo, composições de acentuação estrófica fixa.
Aos exemplos, agradecemos e valemo-nos das coletas de Said Ali (Versificação portuguesa) e Rogério Chociay (Teoria do verso):
Tipo 1: esquema acentual 2-4-6 (- ~ – ~ – ~)
Este padrão iâmbico serve de base a muitos poemas.
Alguns exemplos, ficando destacadas as sílabas tônicas:
Orfeu as cordas fere
(Gonzaga)Pagou coa morte fria
(Camões)
Deste modelo deriva-se duas variações: 2-6 e 4-6; que passam de três para duas o número de sílabas fortes do verso.
Exemplos de uma (2-6):
Também naufragarás
(Cláudio Manuel da Costa)
E de outra (4-6):
Dos litorais do mundo
(Cecília Meireles)
Tipo 2: esquema acentual 1-4-6 (~ – – ~ – ~)
Aqui, temos o esquema anterior com inversão do primeiro pé, que altera-se de iambo para troqueu.
Alguns exemplos:
Olhos que são tão belos
(Camões)Sempre morreu de amores
(Gonzaga)
Além da variação 4-6, este tipo também apresenta a variação 1-6.
Exemplo (1-6):
Ramos amarelecem
(Ribeiro Couto)
Tipo 3: esquema acentual 1-3-6 (~ – ~ – – ~)
Assim como os outros, este tipo é caracterizado por uma base acentual trissilábica, que apresenta variações dissilábicas.
Alguns exemplos:
Ardem ricos perfumes
(Sá de Miranda)Brinca e põe-se a sorrir
(Fagundes Varela)
Exemplo da variação 3-6, que concretiza um movimento anapéstico:
A cantar seus amores
(Camões)
Exemplos de verso hexassílabo
Abaixo veremos alguns exemplos de aplicação do verso hexassílabo em estrofes isométricas e heterométricas:
Verso hexassílabo em estrofes isométricas
Inscrição na areia, de Cecília Meireles
O meu amor não tem
importância nenhuma.
Não tem o peso nem
de uma rosa de espuma!Desfolha-se por quem?
Para quem se perfuma?O meu amor não tem
importância nenhuma.
O que me dói não é, de Fernando Pessoa
O que me dói não é
O que há no coração
Mas essas coisas lindas
Que nunca existirão…São as formas sem forma
Que passam sem que a dor
As possa conhecer
Ou as sonhar o amor.São como se a tristeza
Fosse árvore e, uma a uma,
Caíssem suas folhas
Entre o vestígio e a bruma.
Verso hexassílabo em estrofes heterométricas
Lira XIX, de Tomás Antônio Gonzaga
Nesta triste masmorra,
De um semivivo corpo sepultura,
Inda, Marília, adoro
A tua formosura.
Amor na minha ideia te retrata;
Busca extremoso, que eu assim resista
À dor imensa, que me cerca, e mata.Quando em meu mal pondero,
Então mais vivamente te diviso:
Vejo o teu rosto, e escuto
A tua voz, e riso.
Movo ligeiro para o vulto os passos;
Eu beijo a tíbia luz em vez de face;
E aperto sobre o peito em vão os braços.Conheço a ilusão minha;
A violência da mágoa não suporto;
Foge-me a vista, e caio,
Não sei se vivo, ou morto.
Enternece-se Amor de estrago tanto;
Reclina-me no peito, e com mão terna
Me limpa os olhos do salgado pranto.Depois que represento
Por lago espaço a imagem de um defunto,
Movo os membros, suspiro,
E onde estou pergunto.
Conheço então que amor me tem consigo;
Ergo a cabeça, que inda mal sustento,
E com doente voz assim lhe digo:“Se queres ser piedoso,
Procura o sítio em que Marília mora,
Pinta-lhe o meu estrago,
E vê, Amor, se chora.
Se lágrimas verter, se a dor a arrasta,
Uma delas me traze sobre as penas,
E para alívio meu só isto basta.”
Como eu te amo, de Gonçalves Dias
De mim não saberás como te adoro;
Não te direi jamais,
Se te amo, e como, e a quanto extremo chega
Esta paixão voraz!Se andas, sou o eco dos teus passos;
Da tua voz, se falas;
O murmúrio saudoso que responde
Ao suspiro que exalas.No odor dos teus perfumes te procuro,
Tuas pegadas sigo;
Velo teus dias, te acompanho sempre,
E não me vês contigo!Oculto, ignorado me desvelo
Por ti, que me não vês;
Aliso o teu caminho, esparjo as flores,
Onde pisam teus pés.Mesmo lendo estes versos, que m’inspiras,
— Não pensa em mim, dirás:
Imagina-o, si o podes, que os meus lábios
Não te dirão jamais!
O pássaro cativo, de Olavo Bilac
Armas, num galho de árvore, o alçapão;
E, em breve, uma avezinha descuidada,
Batendo as asas cai na escravidão.Dás-lhe então, por esplêndida morada,
A gaiola dourada;
Dás-lhe alpiste, e água fresca, e ovos, e tudo:
Por que é que, tendo tudo, há de ficar
O passarinho mudo,
Arrepiado e triste, sem cantar?É que, criança, os pássaros não falam.
Só gorjeando a sua dor exalam,
Sem que os homens os possam entender;
Se os pássaros falassem,
Talvez os teus ouvidos escutassem
Este cativo pássaro dizer:“Não quero o teu alpiste!
Gosto mais do alimento que procuro
Na mata livre em que a voar me viste;
Tenho água fresca num recanto escuro
Da selva em que nasci;
Da mata entre os verdores,
Tenho frutos e flores,
Sem precisar de ti!
Não quero a tua esplêndida gaiola!
Pois nenhuma riqueza me consolaDe haver perdido aquilo que perdi…
Prefiro o ninho humilde, construído
De folhas secas, plácido, e escondido
Entre os galhos das árvores amigas…Solta-me ao vento e ao sol!
Com que direito à escravidão me obrigas?
Quero saudar as pompas do arrebol!
Quero, ao cair da tarde,
Entoar minhas tristíssimas cantigas!
Por que me prendes? Solta-me, covarde!
Deus me deu por gaiola a imensidade:
Não me roubes a minha liberdade…
Quero voar! voar!…”Estas coisas o pássaro diria,
Se pudesse falar.
E a tua alma, criança, tremeria,
Vendo tanta aflição:
E a tua mão, tremendo, lhe abriria
A porta da prisão…