Saiba o que é dodecassílabo em poesia, conheça suas características e veja exemplos de sua aplicação!
O dodecassílabo é um tipo de verso que, embora introduzido tardiamente em nossa língua, obteve enorme aceitação e teve utilização sempre crescente.
Este imponente metro é o mais longo que se costuma usar em português em composições regulares.
A seguir, elucidaremos o que é dodecassílabo na poesia, quais são suas características e daremos exemplos de sua aplicação.
Definição de dodecassílabo
Em poesia, dodecassílabo é o nome que se dá ao verso que possui doze sílabas poéticas, segundo a contagem silábica praticada em português.
Nesta contagem, também chamada contagem francesa ou contagem de Castilho, considera-se para efeito de definição do metro o número de sílabas poéticas do verso até sua última sílaba tônica.
Desta forma, o dodecassílabo pode possuir doze, treze ou quatorze sílabas poéticas reais, a depender se sua última sílaba tônica recai em palavra aguda, grave ou esdrúxula, respectivamente.
Este verso é também genericamente conhecido como verso alexandrino; tal denominação é oriunda do Roman d’Alexandre, iniciado no século XII por Lambert le Tort e terminado por Alexandre de Bernay.
Desde então, este metro é o mais cultivado em língua francesa; no século XIX, importamo-lo da França para o português.
Quanto à acentuação, o verso decassílabo possui, normalmente, quatro, cinco ou seis sílabas fortes.
Características do verso dodecassílabo
O verso dodecassílabo, segundo a receita francesa que norteia a imensa maioria de nossos versos, possui, de praxe, acentuação na sexta sílaba, e pode ser dividido em dois hemistíquios de idêntica extensão.
Respeitando-se um intervalo de ao menos uma e não mais de três sílabas átonas entre as tônicas, Rogério Chociay elenca, em Teoria do verso, 24 possibilidades de realização do dodecassílabo, respeitando-se a acentuação na sexta sílaba.
Naturalmente, desrespeitando-se esta regra, as possibilidades são muito mais numerosas.
O dodecassílabo é um verso muito imponente e expressivo, podendo ser utilizado tanto em composições curtas, como um soneto, quanto em composições de maior extensão.
Geralmente, encontramos o dodecassílabo utilizado de forma autônoma em estrofes isométricas, mas não é raro encontrá-lo em estrofes heterométricas, combinado, especialmente, ao tetrassílabo, ao hexassílabo ou ao octossílabo.
Quanto ao ritmo, o verso dodecassílabo, em português, é empregado tanto em estrofes de cadência apenas silábica, quanto silábico-acentual, prevalecendo porém estas últimas, tendo em vista da tradicional acentuação na sexta sílaba.
Tipos de dodecassílabo
É possível dividir o dodecassílabo em dois tipos mais frequentes, a despeito de suas numerosíssimas possibilidades teóricas.
O primeiro tipo, o mais comum, caracteriza-se por respeitar a acentuação tradicional na sexta sílaba, podendo apresentar variados posicionamentos dos demais acentos.
O segundo tipo, explorado especialmente por poetas românticos, caracteriza-se por deslocar o acento obrigatório da sexta sílaba e acentuar de praxe a quarta e oitava, conforme o esquema acentual 4-8-12.
As demais possibilidades, embora as encontremos, são menos usuais, e menos comuns ainda os poemas que as utilizam com cadência estrófica.
Abaixo, daremos exemplos destes tipos.
Tipo 1: esquema acentual 6-12
Este tipo, como nos explica Manuel Said Ali em Versificação portuguesa, caracteriza-se pela acentuação obrigatória na 6ª sílaba, e consiste na combinação de dois hemistíquios de igual extensão que, individualmente, obedecem a qualquer um dos seguintes esquemas acentuais:
- Esquema acentual 2-4-6 (– ~ – ~ – ~)
- Esquema acentual 3-6: (– – ~ – – ~)
- Esquema acentual 1-4-6 (~ – – ~ – ~)
- Esquema acentual 1-3-6 (~ – ~ – – ~)
O dodecassílabo deste tipo, pois, que é o mais tradicional, forma-se repetindo qualquer um destes esquemas ou combinando dois diferentes.
Ainda outras possibilidades poderiam ser arroladas, caso considerássemos aumentar o espaçamento entre as sílabas fortes; e há, de fato, exemplos de tais formas, embora sejam elas menos comuns.
Utilizando apenas os esquemas 1 e 2 acima, daremos alguns exemplos das possibilidades que os envolvem, isto é, de sua duplicação no verso ou de sua combinação.
Exemplos do esquema acentual 2-4-6-8-10-12 (alternância binária, ou ritmo iâmbico), com nosso destaque para as sílabas fortes:
Tu és o meu amigo, e eu sou o teu irmão
(Guerra Junqueiro)Sem ar! Sem luz! Sem Deus! Sem fé! Sem lar!
(Olavo Bilac)
Exemplos do esquema acentual 3-6-9-12 (ritmo anapéstico):
Já não fala Tupã no ulular da procela
(Olavo Bilac)Que mergulha no abismo e mergulha no assombro
(Machado de Assis)
Exemplo do esquema acentual 3-6-8-10-12:
Que nas torres feudais pompeava o velho crime
(Gonçalves Crespo)
Exemplo do esquema acentual 2-4-6-9-12:
Teu pé também deixou um sinal neste solo
(Olavo Bilac)
Tipo 2: esquema acentual 4-8-12
Este tipo é também chamado de dodecassílabo trimétrico ou dodecassílabo romântico e, nesta configuração, aparece muitas vezes misturado ao tipo anterior.
Esta receita, em suma, divide o dodecassílabo em três segmentos, em vez dos tradicionais dois hemistíquios separados pela cesura na 6ª sílaba que caracterizam o tipo anterior.
Outras sílabas podem apresentar-se acentuadas, porém, neste tipo, a divisão dos segmentos fica evidente.
Alguns exemplos, com destaque às tônicas que encerram os segmentos:
Não a tomei, não a beijei! E éramos sós,
(Alberto de Oliveira)E a esbracejar e a recuar clamando vai
(Eugênio de Castro)Que os sonhos partam como partem caravelas!
(Alphonsus de Guimaraens)
Outras variações
Muitíssimas outras variações de dodecassílabo aparecem entre os nossos melhores poetas.
Contudo, o mais comum em composições portuguesas é que um dos tipos acima seja predominante, e os demais, quando aparecem, muito raramente formam estrofes de cadência silábico-acentual.
De qualquer forma, abaixo daremos alguns exemplos de algumas das muitas variações que este metro permite.
Esquema acentual 1-4-7-10-12:
Leva o estrangeiro, como ecos de edênea voz
(Alberto de Oliveira)
Esquema acentual 1-4-9-12:
Vossos reflexos e demorados desmaios
(Alberto de Oliveira)
Esquema acentual 3-7-12:
Extinguia-se com brilhos exiciais
(Eugênio de Castro)
Exemplos de verso dodecassílabo
Abaixo disponibilizamos alguns exemplos de aplicação do verso dodecassílabo:
A um crucifixo, de Antero de Quental
Há mil anos, bom Cristo, ergueste os magros braços
E clamaste da cruz: há Deus! e olhaste, ó crente,
O horizonte futuro e viste, em tua mente,
Um alvor ideal banhar esses espaços!Porque morreu sem eco o eco de teus passos,
E de tua palavra (ó Verbo!) o som fremente?
Morreste… ah! dorme em paz! não volvas, que descrente
Arrojaras de novo à campa os membros lassos…Agora, como então, na mesma terra erma,
A mesma humanidade é sempre a mesma enferma,
Sob o mesmo ermo céu, frio como um sudário…E agora, como então, viras o mundo exangue,
E ouviras perguntar — de que serviu o sangue
Com que regaste, ó Cristo, as urzes do Calvário? —
O navio negreiro, de Castro Alves
III
Desce do espaço imenso, ó águia do oceano!
Desce mais, inda mais… não pode o olhar humano
Como o teu mergulhar no brigue voador.
Mas que vejo eu ali… que quadro de amarguras!
É canto funeral!… Que tétricas figuras!…
Que cena infame e vil!… Meu Deus! meu Deus! Que horror!
Vanitas, de Olavo Bilac
Cego, em febre a cabeça, a mão nervosa e fria,
Trabalha. A alma lhe sai da pena, alucinada,
E enche-lhe, a palpitar, a estrofe iluminada
De gritos de triunfo e gritos de agonia.Prende a ideia fugaz; doma a rima bravia,
Trabalha… E a obra, por fim, resplandece acabada:
“Mundo, que as minhas mãos arrancaram do nada!
Filha do meu trabalho! ergue-te à luz do dia!Cheia da minha febre e da minha alma cheia,
Arranquei-te da vida ao ádito profundo,
Arranquei-te do amor à mina ampla e secreta!Posso agora morrer, porque vives!” E o Poeta
Pensa que vai cair, exausto, ao pé de um mundo,
E cai – vaidade humana! – ao pé de um grão de areia…