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Poema A um crucifixo, de Antero de Quental (com análise)

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Conheça o poema A um crucifixo, de Antero de Quental, e confira nossa análise!

A um crucifixo é um poema escrito pelo poeta português Antero de Quental, publicado originalmente na segunda edição de Odes modernas (1875).

Este poema faz uma crítica social à humanidade, sugerindo ter sido em vão o martírio de Cristo, posto que este não foi suficiente para mudá-la.

Dito isso, preparamos esse texto para que você conheça o poema A um crucifixo, de Antero de Quental. Em seguida, você poderá conferir nossa análise.

Boa leitura!

A um crucifixo, de Antero de Quental

Há mil anos, bom Cristo, ergueste os magros braços
E clamaste da cruz: há Deus! e olhaste, ó crente,
O horizonte futuro e viste, em tua mente,
Um alvor ideal banhar esses espaços!

Porque morreu sem eco o eco de teus passos,
E de tua palavra (ó Verbo!) o som fremente?
Morreste… ah! dorme em paz! não volvas, que descrente
Arrojaras de novo à campa os membros lassos…

Agora, como então, na mesma terra erma,
A mesma humanidade é sempre a mesma enferma,
Sob o mesmo ermo céu, frio como um sudário…

E agora, como então, viras o mundo exangue,
E ouviras perguntar — de que serviu o sangue
Com que regaste, ó Cristo, as urzes do Calvário? —

Análise do poema

A um crucifixo é um soneto construído em dodecassílabos rimados, portanto, é um poema que utiliza metrificação e rima.

O poema resume uma profunda crítica social direcionada à humanidade.

Estrutura do poema

A um crucifixo é um soneto, portanto, possui 14 versos divididos em 4 estrofes, sendo elas duas quadras e dois tercetos.

Os versos são dodecassílabos, ou seja, apresentam, cada um deles, doze sílabas poéticas, verso que é comumente chamado alexandrino.

As quadras apresentam rimas que chamamos enlaçadas, isto é, rimam em parelha dois versos entre dois outros que também rimam, conforme o esquema abba.

Os tercetos apresentam-se conforme o esquema ccd eed.

O verso alexandrino clássico apresenta uma regra de acentuação observada em todos os versos deste poema: sua sexta sílaba é, obrigatoriamente, acentuada, e deve constar tal acento em palavra grave ou aguda; se grave, a palavra deve terminar em vogal que se elida na palavra seguinte.

Sentido do poema

A um crucifixo é um poema que lamenta o estado de permanente degeneração da humanidade.

O poema é dirigido a Jesus Cristo (simbolizado por um crucifixo), como se nota já no título e também na primeira estrofe:

Há mil anos, bom Cristo, ergueste os magros braços
E clamaste da cruz: há Deus! e olhaste, ó crente,
O horizonte futuro e viste, em tua mente,
Um alvor ideal banhar esses espaços!

Estes versos, em suma, querem dizer que Cristo, quando estava na terra, lançou um olhar esperançoso para o futuro da humanidade.

Cristo enxergou, diz o eu lírico, “um alvor ideal” banhá-la futuramente, como se acreditasse que seu exemplo iria iluminá-la.

Porque morreu sem eco o eco de teus passos,
E de tua palavra (ó Verbo!) o som fremente?
Morreste… ah! dorme em paz! não volvas, que descrente
Arrojaras de novo à campa os membros lassos…

Já nesta segunda quadra, a visão de Cristo apresentada na estrofe anterior é refutada com questionamentos.

O eu lírico diz ter morrido “sem eco” o eco dos passos e da palavra de Cristo, sugerindo ambos terem sido ignorados pelos homens.

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Em seguida, em tom de profundo lamento, o eu lírico diz para que Cristo não desça novamente à terra, sugerindo que, se o fizesse, seria novamente crucificado.

Agora, como então, na mesma terra erma,
A mesma humanidade é sempre a mesma enferma,
Sob o mesmo ermo céu, frio como um sudário…

E agora, como então, viras o mundo exangue,
E ouviras perguntar — de que serviu o sangue
Com que regaste, ó Cristo, as urzes do Calvário? —

Nestes tercetos, a justificativa para a sugestão da última estrofe é apresentada: Cristo, se retornasse à terra, seria novamente crucificado porque a humanidade permanece exatamente como era, “enferma”.

Por fim, o eu lírico faz um duro questionamento, insinuando que talvez não serviu de nada o sangue derramado por Cristo, visto que não foi capaz de mudar a humanidade.

A um crucifixo, portanto, é um poema que lamenta o fato de que a humanidade foi incapaz de assimilar e crescer com o exemplo e a palavra de Cristo.

Sobre Antero de Quental

Antero de Quental nasceu em 18 de abril de 1842 em Ponta Delgada, na Ilha de São Miguel, em Portugal.

Era descendente de família nobre, e permaneceu durante a juventude em sua cidade natal, onde cursou os estudos primários e secundários.

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Aos 16 anos, deixou a Ilha de São Miguel para ingressar na Faculdade de Direito de Coimbra, onde se destacou pelo seu brilhantismo e tornou-se uma referência intelectual para seus colegas, como nos testemunha Eça de Queirós.

Teófilo Braga diz o mesmo no prefácio de Raios de extinta Luz:

Antero de Quental vivia entre um grupo de estudantes que o divinizara, considerando-o como um apóstolo, um iniciador da humanidade.

Publicou os primeiros sonetos em 1861, em obra intitulada Sonetos de Antero.

A partir de seus anos de universidade, envolveu-se em diversas questões políticas e sociais portuguesas, prestando conferências, publicando na imprensa e, até, participando da fundação do Partido Socialista Português.

Atuando na imprensa, trabalhou como editor da revista O Pensamento Social e fundou o jornal A República.

Foi acometido de tuberculose, nesta época em que a doença era extremamente temida e letal.

A enfermidade fê-lo mudar-se algumas vezes, levando-o finalmente à terra onde nasceu, e onde viria a morrer.

Adotou as duas filhas de seu falecido amigo Germano Meireles, e seus últimos anos foram dedicados à escrita e a educação das meninas.

Conflitos inúmeros, porém, o atormentaram nestes últimos dias, desde familiares a psicológicos, como diz Francisco Moita Flores, em As mortes de Antero de Quental:

Pulverizado por tormentos de muitas contendas, orgânica e psicologicamente doente, dilacerado por fortes crises emocionais e místicas, a morte surge-lhe como um triunfo sobre todas as limita­ções. O reduto familiar onde esperava encontrar a tranquilidade de uma velhice calma e branda à espera de uma morte desejada, desmorona­ra-se.

Suicidou-se em Ponta Delgada, em 11 de setembro de 1891. “Era um Gênio e era um Santo” — disse seu amigo pessoal e grande escritor Eça de Queirós.

Obras de Antero de Quental

  • Sonetos de Antero (1861)
  • Beatrice (1863)
  • Fiat lux (1863)
  • Odes modernas (1865)
  • Bom senso e bom gosto (1865)
  • A dignidade das letras e as literaturas oficiais (1865)
  • Defesa da Carta encíclica de sua santidade Pio IX (1865)
  • Portugal perante a revolução de Espanha (1868)
  • Primaveras românticas (1872)
  • Considerações sobre a filosofia da história literária portuguesa (1872)
  • Tendências novas da poesia contemporânea a prepósito das Radiações da Noite (1874)
  • Sonetos (1880)
  • A poesia na atualidade (1881)
  • Tesouro poético da infância (1883)
  • Os sonetos completos de Antero de Quental (1886)
  • A filosofia da natureza dos naturistas (1886)
  • Tendências gerais da filosofia na segunda metade do século XIX (1890)
  • Raios de extinta Luz (1892)

Conclusão

Ficamos por aqui!

Esperamos que você tenha gostado de nossa análise do poema A um crucifixo, de Antero de Quental.

Se você curtiu esse conteúdo, não deixe de conferir o que escrevemos sobre Como eu te amo, de Gonçalves Dias.

Um abraço e até a próxima!

Como citar este conteúdo COMO FAZER UM POEMA. Poema A um crucifixo, de Antero de Quental (com análise). [S.I.] 2023. Disponível em: https://comofazerumpoema.com/poema-a-um-crucifixo-antero-de-quental-poesia/. Acesso em: 14 mai. 2024.