Conheça o poema Desencanto, de Manuel Bandeira, e confira nossa análise!
Desencanto é um poema escrito pelo poeta brasileiro Manuel Bandeira que está disponível em seu volume intitulado A cinza das horas (1917).
O poema é datado de 1912, época crítica na vida do poeta, quando este se recuperava de uma doença extremamente mortal naqueles anos: a tuberculose.
Desencanto, pois, como o título sugere, expressa este sentimento perante uma vida que se esvaía aos olhos do poeta.
Sendo assim, preparamos esse texto para que você conheça o poema Desencanto, de Manuel Bandeira. Em seguida, você poderá conferir nossa análise.
Boa leitura!
Desencanto, de Manuel Bandeira
Eu faço versos como quem chora
De desalento… de desencanto…
Fecha o meu livro, se por agora
Não tens motivo nenhum de pranto.Meu verso é sangue. Volúpia ardente…
Tristeza esparsa… remorso vão…
Dói-me nas veias. Amargo e quente,
Cai, gota a gota, do coração.E nestes versos de angústia rouca
Assim dos lábios a vida corre,
Deixando um acre sabor na boca.
— Eu faço versos como quem morre.
Análise do poema
- Tipo de verso: eneassílabo rimado
- Número de e tipo de estrofes: 3 estrofes regulares
- Número de versos: 12 versos
Desencanto é um poema construído em eneassílabos rimados, portanto, é um poema que utiliza metrificação e rima.
O poema, desde o primeiro verso, é a expressão de uma grande angústia experimentada pelo eu lírico, que só faz crescer à medida que correm os versos.
Estrutura do poema
Desencanto possui 12 versos divididos em três quadras (ou quartetos).
O poema utiliza rimas que chamamos alternadas, cruzadas ou entrelaçadas, de forma que todas as estrofes se apresentam conforme o esquema abab.
Os versos são eneassílabos, ou seja, possuem, cada um deles, nove sílabas poéticas. Este é um metro um tanto raro na língua portuguesa, embora de sonoridade interessante.
O padrão rítmico tradicional do verso eneassílabo português segue o movimento anapéstico (– – ~ – – ~ – – ~). Manuel Bandeira, contudo, constrói Desencanto apoiando-se em outros dois acentos regulares (4ª e 9ª sílaba).
Sentido do poema
Desencanto é um poema lírico em que o eu lírico descreve a própria poesia como expressão autêntica do próprio sentimento.
Sendo assim, podemos classificá-lo como um metapoema, ou seja, um poema que reflete sobre o ato de criação poética, que reflete sobre ele mesmo.
Assim é a primeira estrofe:
Eu faço versos como quem chora
De desalento… de desencanto…
Fecha o meu livro, se por agora
Não tens motivo nenhum de pranto.
De início, diz o eu lírico fazer versos “como quem chora” de desalento e de desencanto.
Com isso, quer ele dizer que utiliza a poesia como válvula de escape, como um instrumento que o permite exteriorizar o desalento e o desencanto que sente.
Em seguida, ele recomenda, utilizando a segunda pessoa (“fecha”, “tens”) que o leitor feche o livro caso não tenha “motivo nenhum de pranto”.
Vemos, então, que o eu lírico estabelece, primeiro, uma ligação direta com o leitor e, segundo, que ele faz uma advertência, dando a entender que, se o leitor não tem de que lamentar, é melhor que abandone a leitura do poema, posto que não será capaz de se comover com os versos que sairão carregados de tristeza.
É possível, também, interpretar tal advertência como uma tentativa de evitar machucar aquele que ainda não esteja machucado.
Meu verso é sangue. Volúpia ardente…
Tristeza esparsa… remorso vão…
Dói-me nas veias. Amargo e quente,
Cai, gota a gota, do coração.
Esta estrofe, essencialmente, cumpre a função de expressar a intensidade e a visceralidade dos versos.
É como se o eu lírico dissesse que sua poesia expressa sentimentos reais e intensos, que não trabalha artificialmente as palavras para expressar algo que não experimente verdadeiramente (“Dói-me nas veias”).
Portanto, é uma estrofe que afirma a autenticidade daquilo que é expresso.
Finalmente, assim o poema é concluído:
E nestes versos de angústia rouca
Assim dos lábios a vida corre,
Deixando um acre sabor na boca.
— Eu faço versos como quem morre.
Vemos, pois, que o eu lírico afirma que seus versos saem como se lhe escorressem da boca e deixassem nela um sabor amargo.
Há, porém, a presença de um outro elemento, a vida, que dá um sentido ainda mais profundo à estrofe; sentido este que é explicitado através do potente verso que serve de fechamento ao poema.
Ao dizer que faz versos “como quem morre”, o eu lírico expressa o caráter mais profundo do desencanto que experimenta: ele, ciente de que está a morrer, faz da sua poesia a expressão de sua morte; ou seja, a cada verso que faz, expressa-a e mais se aproxima dela.
Naturalmente, é em razão desta “morte em vida” que o eu lírico se corrói em tristeza. A poesia é-lhe uma tentativa desesperada de encontrar algum alívio para o seu “desencanto” com a realidade.
Desencanto, portanto, é um poema extremamente melancólico em que o eu lírico afirma fazer versos para expressar a angústia que sente diante da ciência de que está a morrer.
Sobre Manuel Bandeira
Manuel Bandeira nasceu em Recife, em 19 de abril de 1886.
Além de poeta, foi professor, cronista, crítico literário e professor.
Aos dez anos, deixou Recife com destino ao Rio de Janeiro, onde, de 1897 a 1902, cursou o secundário no colégio hoje chamado Pedro II, bacharelando-se em letras.
Em 1903, matriculou-se na Escola Politécnica de São Paulo para fazer o curso de engenheiro-arquiteto, abandonando-o no ano seguinte por sofrer de tuberculose.
A doença levou-o a vários sanatórios e fê-lo mudar seguidamente de cidade. Entre 1913 a 1914, esteve recuperando-se em Clavadel, na Suíça.
Parecia a tuberculose sugerir que seria curta a vida do jovem poeta; mas, curiosamente, viveu ele até os 82 anos.
Retornando da Suíça ao Brasil, Manuel Bandeira iniciou sua produção literária em periódicos. Em 1917, publicou sua primeira obra, A cinza das horas, e dali em diante passaria os seus anos em intensa produção artística, dando luz a uma das mais ricas obras da poesia moderna brasileira.
Em 1940, foi eleito para a cadeira 24 da Academia Brasileira de Letras.
Em 13 de outubro de 1968, faleceu, célebre e amplamente considerado um dos maiores poetas da literatura brasileira.
Obras poéticas de Manuel Bandeira
- A cinza das horas (1917)
- Carnaval (1919)
- O ritmo dissoluto (1924)
- Libertinagem (1930)
- Estrela da manhã (1936)
- Lira dos cinquent’anos (1940)
- Belo belo (1948)
- Mafuá do Malungo (1948)
- Opus 10 (1954)
- Estrela da tarde (1960)
Conclusão
Ficamos por aqui!
Esperamos que você tenha gostado de nossa análise do poema Desencanto, de Manuel Bandeira.
Se você curtiu esse conteúdo, não deixe de ver o que escrevemos sobre Soneto do amor total, de Vinícius de Moraes.
Um abraço e até a próxima!