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Poema Questão de pontuação, de João Cabral de Melo Neto (com análise)

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Conheça o poema Questão de pontuação, de João Cabral de Melo Neto, e confira nossa análise!

Questão de pontuação é um poema escrito pelo poeta brasileiro João Cabral de Melo Neto, que está disponível em seu volume intitulado Agrestes (1985).

O poema é interessante por ser inteiramente construído sobre uma metáfora que faz um paralelo entre a pontuação textual e a vida.

Dito isso, preparamos esse texto para que você conheça o poema Questão de pontuação, de João Cabral de Melo Neto. Em seguida, você poderá conferir nossa análise.

Boa leitura!

Questão de pontuação, de João Cabral de Melo Neto

Todo mundo aceita que ao homem
cabe pontuar a própria vida:
que viva em ponto de exclamação
(dizem: tem alma dionisíaca);

viva em ponto de interrogação
(foi filosofia, ora é poesia);
viva equilibrando-se entre vírgulas
e sem pontuação (na política);

o homem só não aceita do homem
que use a só pontuação fatal:
que use, na frase que ele vive
o inevitável ponto final.

Análise do poema

  • Tipo de verso: livre
  • Número de estrofes: 3 estrofes regulares
  • Número de versos: 12 versos

Questão de pontuação é um poema construído em versos livres, portanto, é um poema que não utiliza metrificação nem rima.

O poema faz uma interessante comparação entre a pontuação de um texto e o modo pelo qual se pode viver.

Estrutura do poema

Questão de pontuação possui 12 versos divididos em três quadras.

O poema não utiliza metrificação nem nenhum tipo de rima, não apresentando também um ritmo regular.

Estruturalmente, o poema faz uma afirmação nos dois primeiros versos, que serve de sustentação para o argumento que nos é apresentado nos versos seguintes.

Sentido do poema

Questão de pontuação é um poema que estabelece um paralelo entre a pontuação de um texto e o modo pelo qual se pode viver.

Portanto são versos que, embora literalmente falem sobre a pontuação, em verdade estão dizendo sobre a vida, temática fundamental do poema.

Assim é a primeira estrofe:

Todo mundo aceita que ao homem
cabe pontuar a própria vida:
que viva em ponto de exclamação
(dizem: tem alma dionisíaca);

Os dois primeiros versos constituem a afirmação sobre a qual se apoiará o argumento apresentado no poema.

“Ao homem cabe pontuar a própria vida” quer dizer que ao homem cabe decidir o próprio destino, que ele é livre para escolher como deseja viver.

No terceiro verso, o ponto de exclamação é-nos apresentado como representando uma maneira pela qual se pode viver, e mais adiante o poema nos apresentará outras maneiras, associando-as a sinais de pontuação.

O ponto de exclamação, aqui, representa uma vida afirmativa, entusiástica, e de alguém que assuma tal postura é dito, segundo o narrador do poema, ter “alma dionisíaca”.

Dionísio era um deus da mitologia grega frequentemente associado a um estilo expansivo, vibrante, entusiástico e espontâneo. Uma alma com tais qualidades seria, portanto, uma alma exclamativa.

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Em seguida, o narrador apresenta-nos outras duas maneiras de se viver:

viva em ponto de interrogação
(foi filosofia, ora é poesia);
viva equilibrando-se entre vírgulas
e sem pontuação (na política);

O ponto de interrogação, naturalmente, representa um estilo de vida questionador.

Tal postura é associada à filosofia e à poesia, pois ambas costumam levantar questões sobre inúmeras temáticas, como o sentido da vida, a razão de ser das coisas, o que é e não é belo, entre muitas outras.

No terceiro verso desta quadra, mais uma maneira de viver é-nos apresentada, e desta vez o sentido é mais subjetivo.

Com equilibrar-se entre vírgulas, o poema parece nos sugerir uma vida tortuosa, em que nos esforçamos para superar obstáculos e dificuldades intermináveis, posto que a vírgula nunca encerra uma frase e representa, graficamente, uma interrupção em uma frase que corria “livre”.

Já no último verso desta estrofe, parece o poema sugerir que uma vida “sem pontuação (na política)” é uma vida em que a pessoa não tem voz política, em que não pode “pontuar”.

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Finalmente, chegamos à última estrofe, que conclui o raciocínio:

o homem só não aceita do homem
que use a só pontuação fatal:
que use, na frase que ele vive
o inevitável ponto final.

Aqui, o ponto final, referido como “a só pontuação fatal”, representa a morte.

É possível interpretar esta estrofe em diversos sentidos.

Pelos dois primeiros versos, poderíamos dizer que o poema insinua que o homem só não aceita de outro homem o matar (homicídio) ou o matar-se (suicídio).

Porém, nos versos seguintes, parece este último sentido prevalecer: o homem não aceita que o outro homem use o ponto final (mate-se) como solução para a “frase que ele vive”, isto é, para a circunstância que atualmente experimenta em sua vida.

Numa interpretação menos dramática, poderíamos também dizer que este ponto final pode representar rompimentos e renúncias, ou seja, o ato voluntário de pôr um fim numa fase, num relacionamento ou numa situação.

Com “inevitável”, sugere também o poema que tudo se há de terminar, embora o homem não aceite que tal fim seja proveniente de um ato volitivo.

Assim, Questão de pontuação é um poema que metaforiza a pontuação para fazer uma reflexão sobre a vida.

Sobre João Cabral de Melo Neto

João Cabral de Melo Neto nasceu no dia 9 de janeiro de 1920, em Recife, na casa de seu avô materno.

Pelo lado paterno, era primo de Manuel Bandeira; pelo lado materno, de Gilberto Freyre.

Até os dez anos, viveu em engenhos de açúçar, mudando-se juntamente da família para Recife, em 1930, onde fez os cursos primário e secundário no Colégio dos Irmãos Maristas.

Em 1942, mudou-se para o Rio de Janeiro, publicando neste mesmo ano sua primeira obra poética, Pedra do sono.

Entrou para o serviço público em 1943 e, a partir de 1946, trabalhou para o Departamento Cultural do Itamaraty, onde seguiu com a carreira de diplomata.

Graças à carreira diplomática, residiu em diversas cidades durante a sua vida.

Recebeu vários prêmios literários e, em 1968, foi eleito para a Academia Brasileira de Letras, tomando posse da cadeira 37 no ano seguinte.

Faleceu, no Rio de Janeiro, em 9 de outubro de 1999.

Obras poéticas de João Cabral de Melo Neto

  • Pedra do sono (1942)
  • Os três mal-amados (1943)
  • O engenheiro (1945)
  • Psicologia da composição com a Fábula de Anfion e Antiode (1947)
  • O cão sem plumas (1950)
  • O Rio ou Relação da viagem que faz o Capibaribe de sua nascente à Cidade do Recife (1954)
  • Pregão turístico (1955)
  • Quaderna (1960)
  • Dois parlamentos (1961)
  • A educação pela pedra (1966)
  • Museu de tudo (1975)
  • A escola das facas (1980)
  • Auto do frade (1983)
  • Agrestes (1985)
  • Poesia completa (1986)
  • Crime na calle Relator (1987)
  • Sevilha andando (1989)
  • Primeiros poemas (1990)

Conclusão

Ficamos por aqui!

Esperamos que você tenha gostado de nossa análise do poema Questão de pontuação, de João Cabral de Melo Neto.

Se você curtiu esse conteúdo, não deixe de conferir o que escrevemos sobre Balõezinhos, de Manuel Bandeira.

Um abraço e até a próxima!

Como citar este conteúdo COMO FAZER UM POEMA. Poema Questão de pontuação, de João Cabral de Melo Neto (com análise). [S.I.] 2023. Disponível em: https://comofazerumpoema.com/questao-de-pontuacao-joao-cabral-de-melo-neto/. Acesso em: 25 out. 2024.