Saiba o que é balada em poesia, conheça suas características e veja exemplos de sua aplicação!
A balada talvez seja a mais popular entre as consagradas formas fixas originárias da poesia francesa.
Também sob o nome de balada é classificada, em português, outro tipo de composição muito popular noutras literaturas, e de origem igualmente antiga.
O português, naturalmente, nacionalizou ambas as formas de balada e, hoje, temos abundância de exemplos vernáculos deste tipo de composição.
A seguir, elucidaremos o que é balada em poesia, quais são suas características e daremos exemplos de sua aplicação.
Definição de balada
Na poesia, o termo balada é utilizado para designar basicamente dois tipos de composição.
A primeira delas é a tradicional composição francesa que fixou-se em 28 versos octossílabos, divididos em 4 estrofes, segundo o esquema rímico ababbcbC ababbcbC ababbcbC bcbC, sendo C um verso que se repete como estribilho.
A segunda delas é uma composição de forma variável, mas característica por encerrar uma narrativa, frequentemente folclórica ou lendária, que originalmente era acompanhada de música e dança.
A etimologia de balada, assim como a de balé (ballet), remonta ao latim ballare, que significava dançar.
Do latim, o provençal derivou o termo ballada, “música para festa e dança”, o francês ballade, e o inglês ballad e ballade.
O termo, pois, foi e é aplicado com acepções diversas, embora, em poesia, seu uso mais comum se restrinja às duas acepções já mencionadas, como deixa evidente o inglês.
História da balada
Na poesia portuguesa, o termo balada é utilizado para designar basicamente dois tipos de composição.
Cada um destes tipos evoluiu em tradições literárias distintas a partir de formas poéticas antiquíssimas.
A balada francesa parece ter surgido inspirada em algumas formas poéticas empregadas na poesia provençal.
Sua forma foi fixada no século XIV por Guillaume de Machaut, Eustache Deschamps e Jean Froissart, e foi empregada com grande brilho no século seguinte por Christine de Pisan, Charles d’Orléans e, especialmente, François Villon, principal responsável pela glória deste forma fixa na poesia francesa.
A forma de balada que se tornou tradicional na literatura inglesa e germânica, começou a ficar evidente, segundo J. A. Cuddon, na Idade Média: na Dinamarca, no século XII; na Rússia, no século XIII; na Espanha, Escócia e Inglaterra, no século XIV.
Segundo o mesmo autor, a tradição deste tipo de balada já se via estabelecida no fim do século XIV na Escandinávia e em outros países eslavos, e evoluiu tanto como composição literária, quanto como composição popular, o que permite que alguns críticos façam nela esta distinção.
Em ambos os tipos, as baladas costumavam inspirar-se em histórias da cultura nacional ou folclórica, na vida cotidiana e em lendas populares.
Estas histórias geralmente dramatizavam aventuras, guerras, casos amorosos ou sobrenaturais, entre outros. Um dos personagens muito utilizados como inspiração para baladas, tradicionalíssimo na cultura inglesa, é o Robin Hood.
Na poesia portuguesa, é no período romântico que as baladas passam a ser empregadas com maior frequência, especialmente em decorrência do esforço de Almeida Garrett, principal responsável por popularizá-las.
Tipos de balada
O termo balada, repetindo, aplica-se fundamentalmente em português a dois tipos de composição: um de forma fixa, outro de forma variável, que podemos classificar, em decorrência de sua aplicação tradicional, em balada lírica e balada narrativa.
A seguir demonstraremos, com exemplos, as características de cada uma delas.
Balada lírica (forma fixa)
Este tipo de composição é originário da França e talvez seja a forma fixa mais tradicional da língua francesa, trabalhada por muitos de seus poetas, entre eles, aquele considerado por muitos o maior do idioma: François Villon.
Este tipo de balada é também chamado balada clássica, balada francesa ou, em inglês, ballade (contrastando com ballad) e consiste em 28 versos octossílabos, divididos em 4 estrofes, segundo o esquema rímico ababbcbC ababbcbC ababbcbC bcbC, sendo C um verso que se repete como estribilho.
Também se utiliza esta forma poética em versos decassílabos e dodecassílabos, de forma que as três primeiras estrofes tenham o número de versos equivalente ao número de sílabas de cada verso, e a última estrofe (chamada envio ou oferta) tenha a metade deste número.
Portanto, assim podemos resumir a estrofação da balada francesa, a depender do metro utilizado:
- balada em octossílabos: três oitavas e uma quadra;
- balada em decassílabos: três décimas e uma quintilha;
- balada em dodecassílabos: três estrofes de 12 versos e uma sextilha.
Em contraposição à balada de forma variável, este tipo aplica-se de praxe a construções do gênero lírico, enquanto aquela presta-se ao gênero narrativo.
Abaixo daremos dois exemplos deste tipo de balada em português.
A primeira é assinada por Olavo Bilac e construída em octossílabos (metro mais comum nesta forma poética):
Vi-te pequena: ias rezando
Para a primeira comunhão:
Toda de branco, murmurando,
Na fronte o véu, rosas na mão.
Não ias só: grande era o bando…
Mas entre todas te escolhi:
Minh’alma foi te acompanhando,
A vez primeira em que te vi.Tão branca e moça! o olhar tão brando!
Tão inocente o coração!
Toda de branco, fulgurando,
Mulher em flor! flor em botão!
Inda, ao lembrá-lo, a mágoa abrando,
Esqueço o mal que vem de ti,
E, o meu rancor estrangulando,
Bendigo o dia em que te vi!Rosas na mão, brancas… E, quando
Te vi passar, branca visão,
Vi, com espanto, palpitando
Dentro de mim, esta paixão…
O coração pus ao teu mando…
E, porque escravo me rendi,
Ando gemendo, aos gritos ando,
– Porque te amei! porque – te vi!Depois fugiste… E, inda te amando,
Nem te odiei, nem te esqueci:
– Toda de branco… Ias rezando…
Maldito o dia em que te vi!
A segunda é assinada por Goulart de Andrade e construída em decassílabos:
Pela rosácea do vitral, desfeito
Em cores, entra o pálido luar!
Dorme! Entre as névoas de teu alvo leito
Vejo-te o seio brandamente arfar…
Dorme! Lá fora dorme o velho mar.
Na muda noite, a abóbada infinita
Apenas vela, e, trêmula, palpita.
Dorme! Nos campos adormece a flor
E a ave no ramo, que o Favônio agita,
Como tu, adormece, meu amor.Em vão procuro ouvir, em vão espreito
Se nesse inocentíssimo sonhar
O meu nome se escapa de teu peito,
E a minha imagem tentas abraçar…
Ah! Se estiveras tu no meu lugar!
Dorme! Das rimas a caudal bendita
Desta boca febril se precipita
Num som dulcíssimo e acalentador…
A alma, que eu trouxe antigamente aflita,
Como tu, adormece, meu amor.Dorme! Nem sabes como contrafeito
Vejo-te os lábios sem os não beijar…
Com que desejo, mas com que respeito
Contemplo a tua carnação sem par!
Dorme! Como tu, dorme o nenufar
Da fria linfa na prateada fita…
Só de meu coração a surda grita
Se escuta no silêncio esmagador!
A lembrança das horas de desdita,
Como tu, adormece, meu amorRainha deste ser, dorme e acredita
Que aos brancos pés te deixo a alma precita
Misto de ciúmes, de extase, de ardor…
Ai dorme… a voz que estes cantares dita…
Como tu… adormece… meu amor…
Balada narrativa (forma variável)
Este tipo de composição, popularíssimo nos países de cultura inglesa e germânica, é conhecido em inglês como ballad (contrastando com ballade).
Como já dissemos, a balada de forma variável diferencia-se da de forma fixa principalmente por prestar-se ao gênero narrativo, isto é, por narrar uma história.
O The Penguin Dictionary of Literary Terms and Literary Theory define cinco características principais deste tipo de balada:
- o início da história é geralmente abrupto;
- a linguagem empregada é simples;
- a história é contada através de ação e diálogos;
- o tema é geralmente trágico (embora haja baladas cômicas);
- frequentemente, há um refrão.
Além disso, a mesma obra reforça que estas baladas geralmente tratam de um único episódio, apresentando uma narrativa acelerada, com poucos detalhes e tom fortemente dramático.
Um exemplo deste tipo em português é a Simples balada, de João Ribeiro:
“Tu vais partir, Dom Gil! Sus! Cavaleiro!
“Essa tristeza de tua alma espanca.“Deixa o penhor de um beijo derradeiro
“No retrato gentil de Dona Branca”.,Mas tanto fel no longo beijo havia,
E tanta incomparável amargura,Que o solitário beijo aos poucos ia
Roubando à tela a pálida figura.Cresce, recresce, as linhas devastando,
Nódoa voraz pela figura entorna.Dom Gil, onde se vai, demorando
Não aparece, aos lares não retorna?!E o beijo avulta devorando a trama
Do quadro, haurindo a pálida figura…Tarde chega Dom Gil. De longe exclama:
— “Vou ver-te agora, ó santa criatura!”Funda tristeza o rosto lhe anuvia;
Quem de Dom Gil esta tristeza espanca?Havia um beijo — eis tudo quanto havia!
A tela estava inteiramente branca.
Exemplos de balada
Abaixo daremos dois exemplos adicionais de aplicação da balada em português:
Balada de Arlequim, de Goulart de Andrade
Trouxe por boa triste sina:
Ser nos casais número três.
Onde há Pierrô e Colombina,
Haverá sempre um entremês:
Se ele é feroz, serei cortês;
Far-me-ei taful, se ela é banal…
Nisto de amor, sigo o maltês:
Mais um, mais dois… outro, afinal!Nas minhas vestes de lustrina
Cada quadrículo em xadrez
Tem sua cor, que discrimina
O luto de uma viuvez.
Modéstia, ardor, frio, altivez…
Tudo transpôs o meu umbral.
Mal morre amor, já se refez…
Mais um, mais dois… outro, afinal!Alta ou meã, meda ou franzina,
Loureira ou casta: fiel? Talvez.
Toda essa turba feminina
De feição vária, igual jaez,
Chorou, sorriu, fez e desfez,
Mentiu, jurou… Mas em geral
Nota que mudo o amor por mês,
Mais um, mais dois… outro, afinal!Doida! Estes guizos que em mim vês,
Do beijo é a música infernal:
Ouve-os com a boca, ainda uma vez,
Mais um, mais dois… outro, afinal!
Balada, de Filinto de Almeida
Esta balada apresenta uma ligeira variação: em vez de repetir como estribilho o último verso das estrofes, repete apenas a palavra responsável pela rima:
Por noite velha, no castelo,
Vasto solar de meus avós,
Foi que eu ouvi, num ritornelo,
Do pajem loiro a doce voz.
Corri à ogiva para vê-lo,
Vitrais de par em par abri,
E ao ver brilhar o meu cabelo
Ele sorriu-me, e eu lhe sorri.Venceu-me logo um vivo anelo,
Queimou-me logo um fogo atroz;
E toda a longa noite velo,
Pensando em vê-lo e ouvi-lo a sós.
Triste, sentada no escabelo,
Só com a aurora adormeci…
Sonho… e no sonho, haveis de crê-lo?
Inda o meu pajem me sorri.Seguindo a amá-lo, com desvelo,
Por noite velha um ano após,
Termina enfim o meu flagelo,
Felizes fomos ambos nós…
Como isto foi, nem sei dizê-lo!
No colo seu desfaleci…
E alta manhã, no seu murzelo,
O pajem foge… e inda sorri.Dias depois, do pajem belo,
Junto ao solar onde eu o ouvi,
Ao golpe horrível do cutelo,
Rola a cabeça e inda sorri!…