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Poema No meio do caminho, de Carlos Drummond de Andrade (com análise)

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Conheça o célebre poema No meio do caminho (tinha uma pedra…), de Carlos Drummond de Andrade, com nossa análise e interpretação!

O poema No meio do caminho, de Carlos Drummond de Andrade, talvez dispute com José o título de poema mais famoso deste que é um dos maiores poetas brasileiros de todos os tempos.

Assim como em José, versos do poema No meio do caminho tornaram-se ditos populares no Brasil, conhecidos até mesmo por pessoas que não sabem tratarem-se de versos.

Quando publicado, em 1928, no número 3 da Revista de Antropofagia, No meio do caminho causou grande polêmica e sofreu duras críticas pelo caráter monótono e repetitivo que possui, mormente por repetir “tinha uma pedra” em sete dos dez versos do poema.

Drummond, a despeito ds críticas, incluiu-o posteriormente em sua primeira obra, Alguma poesia e, hoje, é ele um dos poemas mais conhecidos da literatura brasileira.

Sendo assim, preparamos esse texto para que você conheça o poema No meio do caminho, de Carlos Drummond de Andrade e, em seguida, você poderá conferir nossa análise.

Boa leitura!

No meio do caminho, de Carlos Drummond de Andrade

No meio do caminho tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
tinha uma pedra
no meio do caminho tinha uma pedra.

Nunca me esquecerei desse acontecimento
na vida de minhas retinas tão fatigadas.
Nunca me esquecerei que no meio do caminho
tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
no meio do caminho tinha uma pedra.

Análise do poema

  • Tipo de verso: livre
  • Número e tipo de estrofes: 2 estrofes irregulares
  • Número de versos: 10 versos

O poema No meio do caminho é construído em versos livres (ou irregulares), isto é, em versos que não utilizam metrificação e também dispensam a rima.

É muito difícil compreender exatamente a intenção de Drummond com este pequeno poema, portanto, o que podemos fazer é conjeturar.

Em primeiro lugar, quanto à parte técnica, cabe dizer que Drummond vale-se da repetição de termos e da técnica que chamamos em poesia de paralelismo de forma exagerada, quase ridícula

Exatamente por isso, o poema sofreu duras críticas, pois soa estúpido um discurso que repete tantas vezes os mesmos termos: “tinha uma pedra”, como já mencionamos, aparece em sete dos dez versos do poema.

Mas Drummond, bem sabemos, nada tinha de estúpido, então o que podemos fazer é imaginar por que tanta ênfase, tanto exagero na redundância que é explícita no poema.

A primeira hipótese, reforçada por alguns teóricos, é que Drummond quis, através do poema, ridicularizar os parnasianos ou simplesmente opor-se a eles.

O parnasiano Olavo Bilac possui um soneto intitulado Nel mezzo del camin… (“No meio do caminho…”), que replicamos abaixo:

Cheguei. Chegaste. Vinhas fatigada
E triste, e triste e fatigado eu vinha.
Tinhas a alma de sonhos povoada,
E a alma de sonhos povoada eu tinha…

E paramos de súbito na estrada
Da vida: longos anos, presa à minha
A tua mão, a vista deslumbrada
Tive da luz que teu olhar continha.

Hoje, segues de novo… Na partida
Nem o pranto os teus olhos umedece,
Nem te comove a dor da despedida.

E eu, solitário, volto a face, e tremo,
Vendo o teu vulto que desaparece
Na extrema curva do caminho extremo.

Neste soneto, percebemos que Bilac claramente utiliza, como Drummond, a repetição de termos e o paralelismo, embora de forma muitíssimo menos exagerada.

Bilac ainda utiliza, na primeira estrofe, a palavra “fatigada”, que também é utilizada por Drummond.

Porém, como parnasiano que era, era Bilac um esteta, e portanto o exagero de Drummond lhe replicando ideias semelhantes poderia, sim, configurar um deboche e uma oposição ferrenha.

Há quem diga, inclusive, que os próprios parnasianos seriam as supostas “pedras no caminho” de Drummond.

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Por outro lado, não há evidência suficiente para afirmar o que está dito, inclusive por estar a frase “no meio do caminho” presente em versos da Divina comédia, de Dante:

Nel mezzo del cammin di nostra vita
Mi ritrovai per una selva oscura
Che la diritta via era smarrita

Por isso, também poderíamos imaginar que Drummond simplesmente inspirou-se em Dante e, do mesmo ponto de partida, quis ostensivamente expor uma nova maneira de fazer arte.

Essa é uma hipótese também plausível, especialmente se notarmos o contexto em que o poema foi escrito, em pleno movimento modernista, sendo ele também publicado pela primeira vez numa revista modernista.

Assim, o poema seria um estandarte dos novos ideais estéticos que Drummond tencionava introduzir na poesia brasileira.

Uma terceira interpretação, já mais cimentada no sentido evidente dos versos “Nunca me esquecerei desse acontecimento / na vida de minhas retinas tão fatigadas” é que Drummond quis transmitir ao leitor toda a fadiga, todo o tédio que sentia em determinado momento através de um poema repetitivo e monótono.

Outros, ainda, salientam o “nunca me esquecerei desse acontecimento” e querem inferir que o poema representa algum acontecimento específico e marcante na vida de Drummond.

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As possibilidades são praticamente ilimitadas…

O que é fato incontestável, contudo, é que ninguém jamais poderia imaginar que um poema de construção aparentemente aleatória, de linguagem tão simples, de encadeamento truncado, irregular, sem música e sem rima pudesse ecoar por tantas décadas e se tornaria um dos poemas mais conhecidos da língua portuguesa.

Sobre Carlos Drummond de Andrade

Carlos Drummond de Andrade nasceu em Itabira, Minas Gerais, em 31 de outubro de 1902.

Filho de proprietários rurais, ele passou a primeira infância no interior desta cidade, estudando no Grupo Escolar Dr. Carvalho Brito.

Em 1916, foi a Belo Horizonte iniciar seus estudos no internato e colégio Arnaldo.

Em 1918, mudou-se para Nova Friburgo (RJ) para estudar no colégio Anchieta. Ali permaneceu por um ano, acabando expulso por “insubordinação mental”, após ter um atrito com seu professor de português.

Em 1923, iniciou o curso de Farmácia na Escola de Odontologia e Farmácia de Belo Horizonte, concluindo-o em 1925. Neste mesmo ano, foi um dos fundadores do periódico modernista A Revista.

Em 1926, embora formado farmacêutico, foi a Itabira para trabalhar como professor de geografia e português, voltando a Belo Horizonte no mesmo ano, para ser redator no Diário de Minas.

Em 1930, Drummond, de forma independente, publicou seu primeiro livro, Alguma poesia. O reconhecimento literário só viria, porém, em 1942, com a publicação de Poesias.

Drummond exerceu em vida alguns cargos públicos e atuou, a princípio, como auxiliar de gabinete da Secretaria do Interior. Depois assumiu a chefia do gabinete do Ministério da Educação. Entre 1945 e 1962 atuou como funcionário da Diretoria do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (DPHAN), onde se aposentou como chefe de seção.

O poeta casou-se uma e foi pai duas vezes, falecendo no Rio de Janeiro, em 1987, apenas doze dias após à morte de sua filha.

Obras de Carlos Drummond de Andrade

Poesia

  • Alguma poesia (1930)
  • Brejo das almas (1934)
  • Sentimento do mundo (1940)
  • Poesias (1942)
  • A rosa do povo (1945)
  • Novos poemas (1948)
  • Claro enigma (1951)
  • Viola de bolso (1952)
  • Fazendeiro do ar (1954)
  • A vida passada a limpo (1955)
  • Lição de coisas (1962)
  • Versiprosa (1967)
  • Boitempo (1968)
  • A falta que ama (1968)
  • Nudez (1968)
  • As impurezas do branco (1973)
  • Menino antigo (1973)
  • A visita (1977)
  • Discurso de primavera e algumas sombras (1977)
  • O marginal Clorindo Gato (1978)
  • Esquecer para lembrar (1979)
  • A paixão medida (1980)
  • Caso do vestido (1983)
  • Corpo (1984)
  • Eu, etiqueta (1984)
  • Amar se aprende amando (1985)
  • Poesia errante (1988)
  • O amor natural (1992)
  • Farewell (1996)

Prosa

  • Confissões de Minas (1944)
  • Contos de aprendiz (1951)
  • Passeios na ilha (1952)
  • Fala, amendoeira (1957)
  • A bolsa & a vida (1962)
  • A minha vida (1964)
  • Cadeira de balanço (1966)
  • Caminhos de João Brandão (1970)
  • O poder ultrajovem e mais 79 textos em prosa e verso (1972)
  • De notícias & não notícias faz-se a crônica (1974)
  • 70 historinhas (1978)
  • Contos plausíveis (1981)
  • Boca de luar (1984)
  • O observador no escritório (1985)
  • Tempo vida poesia (1986)
  • Moça deitada na grama (1987)
  • O avesso das coisas (1988)
  • Autorretrato e outras crônicas (1989)

Conclusão

Ficamos por aqui!

Esperamos que você tenha gostado de nossa análise do poema No meio do caminho, de Carlos Drummond de Andrade.

Se você curtiu esse conteúdo, não deixe de ver a nossa análise do poema José, de Carlos Drummond de Andrade.

Um abraço e até a próxima!

Como citar este conteúdo COMO FAZER UM POEMA. Poema No meio do caminho, de Carlos Drummond de Andrade (com análise). [S.I.] 2022. Disponível em: https://comofazerumpoema.com/no-meio-do-caminho-carlos-drummond-de-andrade/. Acesso em: 2 mai. 2024.